São Paulo, sábado, 12 de abril de 1997
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O pau vai comer

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - A barbárie quase simultânea e simétrica das Polícias Militares do Rio e de São Paulo constitui um anúncio da ameaça que todos corremos, pobres ou ricos, brancos ou negros, ordeiros ou desordeiros. Ficaremos à mercê de uma tropa armada e sem preparo moral e psicológico para merecer qualquer parcela de autoridade.
Nem adianta botar culpa nos governadores. O cipoal de leis, regulamentos, prazos, direitos e acórdãos mais cedo ou mais tarde devolverá às ruas esses policiais, que, aliás, já tinham antecedentes iguais ou piores.
E o grosso dos policiais, em descobrindo que a sociedade não está aparelhada para reprimir o abuso da força, fatalmente descerá a lenha: o pau vai comer.
Mesmo que cada cidadão se transforme em cinegrafista amador e as TVs exibam o descalabro em horário nobre, mesmo que o poder dos governadores procure uma solução para cada caso, a inércia operacional dos tribunais disso ou daquilo será um "plus" que, somado ao corporativismo das quadrilhas dentro ou fora da lei, colocará todos os cidadãos, em determinadas circunstâncias, diante de um muro e na frente de um cassetete.
Nem adiantará a convencional fórmula de intimidação do "sabe com quem está falando?" Não estamos diante de um caso banal de impunidade, mas de um novo conceito de poder.
A polícia pode andar armada, pode deter qualquer cidadão em qualquer parte, pode revistá-lo com ou sem violência -e evidente que a porção animal do ser humano numa hora dessas vem à tona.
O que poderá acontecer ao bandido fardado? Um vexame efêmero, uma punição disciplinar, uma prisão facilitada pelas mordomias dos colegas de farda e de crime. E ao mesmo tempo, um maior prestígio entre os iguais. Senhores, estamos... como é mesmo aquela palavra que começa com ph de pharmácia?

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