São Paulo, quinta-feira, 17 de abril de 1997 |
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Reforma agrária cria os sem-informação
GILBERTO DIMENSTEIN
Há em essência uma questão a ser respondida: qual o retorno do investimento de assentar as famílias? Ninguém sabe. E, pior, parece não estar importando, tão politizado e emocionalizado virou o tema, cada qual tentando tirar uma lasca do episódio. Um episódio que tem o dom de colocar para fora as marchas da omissão, violência e injustiça no campo. Agora serve de escudo para mais categorias de despossuídos -políticos sem-bandeira, os sindicatos sem-espaço e, vamos ser honestos, jornalistas sem-assunto. Não se sabe quantas famílias deveriam receber um pedaço de terra. O governo e movimento sem-terra falam em números tão diferentes que parecem estar tratando de temas diferentes. O movimento sem-terra fala em 4 milhões de famílias; o governo fala em 1 milhão. Os efeitos dessa diferença são obviamente gigantescos. Suponha-se que cada família assentada custe mesmo, no mínimo, R$ 40 mil, como apontam as autoridades. Se formos seguir as contas dos sem-terra, os cofres públicos teriam de desembolsar R$ 160 bilhões; pelo governo, sairia por R$ 40 bilhões. O problema é que, nem sequer se conhece o valor de um assentamento. O ministro Raul Jungmann vai além dos R$ 40 mil. Com as obras de infra-estrutura (escola, esgoto, centros de saúde) pularia, quem sabe, para R$ 60 mil. Os sem-terra rebatem, dizem que o governo mente e exagera. Suponha-se, entretanto, que, por milagre, chegássemos a um valor que todos concordassem, multiplicando o número de famílias pelo valor de cada assentamento. Chegamos ao essencial: até onde é um investimento social que vale a pena ser feito? Essa questão parece, absurdamente, ter ficado sem sentido, apesar de a tendência da globalização aliada à tecnologia se a de levar as pessoas às cidades. Sem dúvida, cabe ao governo enfrentar a miséria -e o governo Fernando Henrique Cardoso, com ou sem neobobismo, está longe de brilhar tanto quanto brilha no combate à inflação. Entre o que prometeu e o que cumpre de reforma agrária, há evidente distância. Pode parecer, neste momento, política ou moralmente inadequado tocar nestes pontos. Afinal, todos estamos movidos pelas cenas dos andarilhos sem esperança. O fato é que, com R$ 100 bilhões (se é para chutar, fiquemos meio-termo entre os chutes do governo e dos sem-terra), seria possível, por exemplo, reduzir a níveis de país desenvolvido a mortalidade infantil no Brasil -o que significaria mais de 100 mil vidas salvas todos os anos. Com esse valor seria possível dar oito milhões de bolsa-escola durante dez anos (cada bolsa sai R$ 1 mil por ano), o que acabaria com a indigência, evasão escolar e aumentaria a produtividade do trabalhador. Uma discussão séria e madura deve colocar essas contas no papel, por mais dolorosas que pareçam. Os novos níveis de cidadania exigem que saibamos aliar a emoção com matemática. Do contrário, a categoria dos sem-informação vai ser tão vitimizada quanto os sem-terra. Texto Anterior: Privatização pode pagar reforma agrária Próximo Texto: Leque amplo de apoio preocupa liderança Índice |
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