São Paulo, terça-feira, 22 de abril de 1997
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A marcha depois da Marcha

JANIO DE FREITAS

Um efeito imprevisto no êxito da Marcha dos Sem-Terra foi a mudança de grau e de disposições no que respeita à eleição presidencial, ainda distante mais de ano e meio. Seria esperável que a quebra da crista arrogante do governo provocasse, de imediato, uma excitação esperançosa nos partidos de oposição, para a formulação da sempre reclamada e jamais esboçada política oposicionista. Não foi o que se deu, no entanto. Os novos ânimos trocaram programas em conjunto pela individualização.
Neste sentido, e mesmo que sem menção a um nome, tem relevância especial a repentina disposição procedente do PMDB, advertindo que o partido pretende ter candidato próprio na eleição presidencial de 98. Ainda que isso não reflita intenção com apoio já comprovado da maioria, encontra alguma confirmação nos fatos imediatos. Por exemplo, no convite a Itamar Franco para participar, mesmo sem ser filiado, do programa do PMDB na atual propaganda gratuita. No Congresso, os peemedebistas descontentes com Fernando Henrique são numerosos e, mais importante, influentes no partido. Tanto nos contatos que o estão levando a numerosas cidades mineiras, como nas entrevistas destes últimos dias, Itamar Franco adotou a explicitude total no propósito de candidatar-se. E de recuperar logo a responsabilidade maior pela adoção do Plano Real, com referências diretas aos fatos e à sua condição na época. A propósito, na recente série de conversas programadas com jornalistas, a alguns deles Fernando Henrique fez referência ao propósito eleitoral de Itamar Franco. Sempre na parte da conversa chamada "em off", de publicação vetada, tratou o assunto com jeito desdenhoso. A seu ver, Itamar fala na candidatura presidencial, mas não será candidato, usando-a agora para fortalecer a posição com vistas ao governo de Minas.
Fernando Henrique, aliás, fala do seu segundo mandato como se já o tivesse assegurado. É assim, por exemplo, que trata como mera informação antecipada o destino pretendido para o PFL, que "não terá no segundo mandato a relevância que tem agora no governo".
De volta aos ânimos ativados ou reativados, Luiz Inácio Lula da Silva também resolveu abandonar os subterfúgios, dando à sua disposição de candidatar-se o caráter de um recado-advertência ao seu complicado partido: está pronto e confiante, desde que os petistas se disponham a corrigir o erro de recusar coligações e outras formas de aliança. Foi, também, um recado para Tarso Genro, o ex-prefeito bem-sucedido de Porto Alegre, cada vez mais aplicado em fazer contatos claros para sua possível candidatura e escrever artigos obscuros, ao que parece, para mostrar-se um petista com armamento intelectual até sociológico, também ele.
Mal acaba uma eleição presidencial, começam em surdina as primeiras especulações e tramas já voltadas para a eleição seguinte. Mas a antecipação da explicitude de agora foge à norma. Logo se verá se é precipitação passageira, sugerida só pelas circunstâncias, ou se é outra marcha que se inicia contra a vontade de Fernando Henrique. E contra o próprio.

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