São Paulo, terça-feira, 22 de abril de 1997
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'Chegou a hora de a Justiça dar o exemplo', diz mãe

DA AGÊNCIA FOLHA, EM PAU BRASIL

Galdino Jesus dos Santos era o filho mais velho de Minervina Maria de Jesus, 58. Quando ele nasceu, ela tinha apenas 13 anos.
Mãe de 20 filhos, seis mortos quando bebês e três de doenças na infância, ela teve apenas três homens entre os 11 filhos que chegaram à idade adulta. Dois já estão mortos. Seu filho João Cravinho de Jesus morreu com 34 anos em 1988, numa emboscada, com golpes de facão. Ele era um dos líderes da tribo e tinha ativa participação na ação dos índios para garantir a posse de sua área.
"Não sei se vou aguentar ver meu filho chegando", disse chorando em frente a seu casebre de pau-a-pique de 30m². Ela toma remédios enviados pela Funai porque tem problemas do coração.
Nascida na própria aldeia, Minervina pediu ao cacique da tribo para adiar o enterro para amanhã, pois quer ficar mais tempo ao lado do filho. Leia os principais trechos da entrevista.
*
Agência Folha - O que a sra. espera da Justiça em relação aos que mataram seu filho?
Minervina Maria de Jesus - Trinta anos de cadeia é muito pouco pelo que fizeram com meu filho. Gostaria de dizer ao presidente Fernando Henrique que chegou a hora de a Justiça dar o exemplo e punir os culpados.
Agência Folha - Esta morte pode intimidar a aldeia?
Minervina - De jeito nenhum. Isso nos dá mais força para lutar pela nossa terra. Os fazendeiros têm dinheiro, mas nós temos a razão e a Justiça do nosso lado.
Agência Folha - A sra. perdoa os adolescentes que participaram do crime?
Minervina - Perdão, só com Deus. Esse foi o momento mais triste de minha vida e quero apenas que se faça justiça.
Agência Folha - Como será o momento de receber o corpo?
Minervina - Não sei se aguentarei ver meu filho chegando. Ele se despediu de mim com um sorriso na quarta-feira e disse que, quando voltasse, faria uma grande festa para comemorar a reintegração de parte de nossa área que foi tomada pelos fazendeiros. Agora, ele vai chegar dentro de um caixão.
Agência Folha - A sra. deixará seu único filho homem prosseguir na briga pela terra?
Minervina - Já perdi dois filhos lutando para garantir o direito que é nosso. Acho que o meu último filho homem também deve seguir o mesmo caminho, porque acima de tudo essas terras nos pertencem. Deus vai nos dar mais força para lutar ainda mais.
Agência Folha - Seus filhos já receberam ameaça de morte?
Minervina - Todas as pessoas da tribo que estão exigindo a terra já foram ameaçadas. Os fazendeiros dificilmente vão à área, mas mandam pistoleiros.
Agência Folha - Quem são os culpados pela morte de seu filho?
Minervina - A maior culpa cabe ao governo federal, que até hoje não concedeu a posse definitiva da terra para a tribo. Meu filho só foi a Brasília para tentar acelerar o processo de reintegração.

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