São Paulo, sexta-feira, 25 de abril de 1997
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Sequestro pode deixar sequela psicológica

STUART YOUNG
DA "REUTER", EM TÓQUIO

Especialistas japoneses em saúde mental afirmam que os reféns japoneses, ao retornar para casa depois de resgatados da residência do embaixador japonês em Lima, correm o risco de sofrer estresse mental periódico.
Para a psicoterapeuta Naho Kikuchi, os 126 dias passados confinados dentro da casa, convivendo com o temor da morte iminente, vão provocar em ex-reféns dores físicas sem causa aparente e temores repetitivos, desencadeados por acontecimentos aleatórios.
"Com os sintomas do estresse pós-traumático (EPT), a pessoa se sente psicologicamente estressada, sem saber por quê. Em alguma data significativa, ela pode vir a sentir dores de estômago, e essas dores serão um alerta físico para que procure lidar com seu problema emocional", disse.
Para Mariko Kobayashi, diretora de um Centro de Aconselhamento em Saúde, é possível que os ex-reféns sejam transferidos para cargos diferentes dos que ocupavam antes do sequestro, porque talvez não estejam capazes de desempenhar os mesmos trabalhos.
"As pessoas que antes trabalhavam nos escalões mais altos e que de repente se viram vivendo numa situação em que não sabiam se ainda estariam vivas no dia seguinte provavelmente levarão uma dor muito grande consigo quando voltarem a suas empresas. Esse fato provavelmente vai influir sobre os cargos que lhes serão confiados quando retornarem", afirmou ele.
A síndrome do estresse pós-traumático tornou-se amplamente conhecida no Japão depois do terremoto de Kobe e do ataque com gás sarin no metrô de Tóquio em 95.
Físico e mental O Ministério da Saúde enviou dois especialistas em desordens mentais ao Peru, num sinal da preocupação com a saúde mental dos reféns libertados.
Durante o cerco, segundo médicos da Cruz Vermelha, os 72 reféns sofreram de pressão alta, depressão leve e outros distúrbios relacionados ao estresse. Mas, segundo Kikuchi, é muito possível que os efeitos mentais do sequestro perdurem por muito mais tempo do que os físicos. "Fisicamente eles podem aparentar estar bem, mas psicologicamente vão continuar sofrendo", afirmou ela.
Gatilhos
Os aniversários do início do sequestro e do dia do resgate podem funcionar como gatilhos que desencadeiem crises de angústia, disse Kikuchi. "A coisa pode chegar ao ponto em que eles não conseguirão funcionar normalmente, não vão conseguir sair da cama e ir trabalhar, e até mesmo seus relacionamentos pessoais começarão a sentir os efeitos do estresse. Nessas situações, as pessoas descarregam a tensão em seus familiares, e a coisa pode ficar séria."
A inexplicável confusão emocional sentida pelos portadores de EPT pode ser especialmente difícil de suportar para os 24 reféns japoneses, todos respeitados diplomatas e executivos, disse Kikuchi.
"Os reféns eram japoneses que ocupavam altos cargos, que aprenderam a não demonstrar medo. É realmente importante que os familiares desses homens sejam ajudados a lidar com esse incidente."
Outro fato que poderá assombrar os reféns são sons semelhantes a explosões ou às marchas militares que as tropas antiterror tocavam em alto volume para ocultar o som da escavação dos túneis.
Segundo a psicoterapeuta, há ainda outro fator que poderá deixar uma marca nos reféns: a morte de todos os guerrilheiros do MRTA, muitos adolescentes.

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