São Paulo, sábado, 10 de maio de 1997
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A venda do elefante

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - O circo atravessava uma crise -aliás, uma das razões da existência do circo era justamente essa: atravessar crises. Havia sempre um salvador da pátria e do circo que tinha uma idéia para vencer a crise, fosse ela qual fosse.
Dessa vez, o problema era de caixa -das outras vezes também era, pois o circo nem chegava a ter uma caixa, vivia do varejo e de algumas poucas atrações, entre as quais a mais evidente era um elefante.
Com a globalização no mercado de lazer, da TV grátis e paga, mais a Internet, a renascença do cinema nacional, o fomento cultural Rio-São Paulo etc, o circo descobriu que perdia espaço no mercado e partiu para a modernização.
O elefante foi eleito a besta negra do atraso, do radicalismo ideológico. Na equação custo-benefício, só não era deficitário porque ninguém sabia exatamente quanto ele valia e quanto custava.
Duas correntes se formaram a respeito da venda. O empresário, que era dono da lona, o relações-públicas, o motociclista que andava no globo da morte e o mágico internacional -uns diziam que era chinês, outros que era mesmo de Piracicaba- tinham pressa em vender o elefante. Alguns jornalistas, que entravam de graça no circo, aderiram à idéia da venda e achavam que, sem elefante, o circo seria tão atraente quanto a Disneylândia e tão cultO como a Sorbonne.
O resto do circo (palhaços, amarradores de cachorro, vendedores de pipoca) alegava que o elefante era estratégico -fato negado pelos economistas: em tempos eletrônicos, qualquer idiota podia fazer um elefante virtual que dava no mesmo, sem a inconveniência de sujar o chão.
Depois de muita briga venderam o elefante, mas o circo não melhorou com isso. Foi então que o mágico internacional -descobriram que não era chinês nem de Piracicaba, era apenas vagamente baiano- sugeriu que se vendesse o circo inteiro. Dessa forma, o problema da caixa ficaria para os outros.

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