São Paulo, sexta-feira, 16 de maio de 1997
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Gabriel Villela faz infantil para adultos

DANIELA ROCHA
ENVIADA ESPECIAL A CURITIBA

O teatro Guaíra, de Curitiba, investiu em uma produção que superou R$ 200 mil para lançar a retomada dos trabalhos de seu núcleo cênico, o Teatro de Comédia do Paraná (TCP).
Para chamar a atenção da mídia e do público, convidou um diretor de renome, o mineiro Gabriel Villela, para selecionar os atores e músicos para a montagem de "A Aurora da Minha Vida", texto do dramaturgo paulista Naum Alves de Souza.
Os planos ambiciosos resultaram em uma montagem extremamente cuidadosa e correta.
Perversidade em poesia O cenário é a sala de aula. O texto, montado pela primeira vez em 1981 pelo próprio autor, retrata os anos da escola da disciplina rígida que usava palmatória para punir alunos que não se comportavam, das aulas de latim, francês, religião e música com professores especialistas ou com padres e freiras, dos alunos com uniformes aprumados. Tudo isso em um clima encantador, nostálgico (a perversidade daquela época virou poesia).
Quem viveu a época daquela escola no Brasil -e também quem não viveu- acaba se entretendo com a montagem e ri de momentos engraçados. Para entrar no clima, Gabriel Villela montou um musical. O formato de poderia ser comparado ao de uma revista.
A peça tem músicas cantadas do começo ao fim -também tratada com cuidado e preparação vocal de Babaya, que trabalha com vários grupos mineiros, entre eles, o Galpão e o Ponto de Partida. Traz também coreografia à cena. Tudo de forma organizada, limpa, simétrica. Talvez tão limpa e simétrica que todo o lado político do texto acaba não aparecendo. Resplandece a bandeira do Brasil em época do aprendizado ufanista -"um dia essas crianças vão governar o país"-, explorado pela tão falada "brasilidade" do diretor.
O texto traz as caricaturas nos alunos: a gorda da sala, o bobo, o puxa-saco, o quieto; e nos professores: o bonitão, a freira legal, a rígida, a velha. Tudo montado de forma a entreter.
Os figurinos são cuidados e sem exageros, mas infantis, os atores causam empatia, alguns se destacam, como o órfão revoltado e o professor de português, interpretado por Ranieri Gonzales.
A iluminação, de Maneco Quinderé, quebra o ambiente seco da sala de aula com projeções e cores. No palco está o velho quadro negro, carteiras (cadeiras unidas às mesas), mesa do professor e, ao fundo no alto, uma bandeira do Brasil transparente por onde se vê três músicos que tocam ao vivo no espetáculo -em tom e presença também rigidamente medidos, sem invadir as vozes dos atores e sem desaparecer.
Tudo é tão minimamente calculado que o espetáculo parece ser mera encenação de falas pontuadas. Não existe uma "sujeira" em cena, seja nas idiossincrasias da época que o texto traz -a escola "correta" é formadora de racistas, classistas e cínicos-, seja na sua realização em cena. O filho do criminoso fica igual às gêmeas ricas. A sala de aula vira um salão de baile que não existe, onde a cada música, dança um par diferente sem sair do ritmo.

Peça: A Aurora da Minha Vida
Autoria: Naum Alves de Souza
Direção: Gabriel Villela
Elenco: Fabiana Ferreira, Ranieri Gonzalez, Jana Mundana, Mauricio Vogue,Marino Jr., Jeanine Rhinow, Monika Kelller, Fabio Tavares e Giuliano Sartori
Quando: de qua a dom, às 20h30
Onde: Guairinha (r. 15 de Novembro, s/nº, tel. 041/232-9145)
Quanto: R$ 5 (qua) e R$ 10 (qui a dom)

A jornalista Daniela Rocha viajou a Curitiba a convite da produção do espetáculo

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