São Paulo, sexta-feira, 16 de maio de 1997
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Maio, trovão e raio

JOSÉ SARNEY

Delfim Netto, com sua inteligência e ironia, foi muito preciso ao resumir a crise da Câmara como uma brincadeira de meninos: se o plenário é tratado como criança, ele não tem dificuldade de assumir a posição e vai do apito à língua de vaca. É uma questão de tempo e recreio.
Mas, cá para mim, o que está ocorrendo na Câmara é um problema zodiacal. Primeiro a turma do perder no apito; agora, bem, agora ninguém sabe o que vai apitar no telefone.
O mês de maio, que no Maranhão se diz ser aquele mês de trovão e raio, transformou-se no mês do apito e outras coisas. É preciso ver as coincidências. Apita-se na Câmara e o senhor Ivens Mendes, presidente da Comissão Nacional de Arbitragem de Futebol, usa o apito para tentar ganhar alguns votos em Limoeiro do Oeste -Minas Gerais- e do alto de sua arbitragem oferece, também, alambrado em campinho, jogo de camisas e um curso de arbitragem de quatro dias.
Recursos para isso vêm, justamente, do apito. Conseguir que o apito de outros jogos apitem contra as regras do futebol.
Veja-se que não é à toa que a alta Comissão Nacional do Futebol tem o nome de "arbitragem". Ora, a arbitragem é um instituto de direito internacional que foi criado para dirimir querelas e diferendos entre as nações, tudo na busca de procurar o justo e afastar o injusto. Mas árbitro não é somente de futebol ou de direito internacional.
O vice-presidente Marco Maciel é o autor de uma lei sobre arbitragem para ajudar a rapidez judicial. Arbitragem é, também, uma fórmula de cálculo para realizar uma operação mercantil, que se utiliza inclusive de fórmulas matemáticas complicadas, que não é necessário ensinar na escola do Ivens Mendes. Exemplo: o BNDES chama a Merryl Lynch para avaliar o preço de venda da Vale do Rio Doce. Ela arbitra, a Bolsa vende e, do lado de fora, somente resta aos que são contra o apito e correr dos cachorros.
Enquanto isso, fugindo aos apitos, o prefeito Honório Lacerda, de Limeira do Oeste, diz ao repórter, quando chamado à colação sobre as ajudas que recebeu do sr. Mendes: "Para mim, tanto importa de onde veio o dinheiro com o qual ele nos ajudou. Põe aí no seu jornal que nosso campinho precisa de arquibancada e de iluminação".
O diabo dessa história toda é que tudo isso (doações, bonés, uniformes, equipagens e cursilhos de arbitragem) é feito para que o "árbitro" tivesse um lugar de deputado e, certamente, apitar no plenário da Câmara.
As coisas estão misteriosas e eu acredito que isso tudo, neste mês, é pela passagem do cometa Hale-Bopp. Veja-se a atual novela das oito: votos, devotos e subornos.
Finalmente, tenho de protestar sobre a situação do Corinthians, metido nessa história. É infâmia, porque o Corinthians jamais ganhou partida no apito nem no tapetão, só no pé. Isso é história montada pelo Palmeiras ou pelo São Paulo, ou vai ver pelo Moto Clube do Maranhão. Nada de apito!
A verdade toda é que se o apito na Câmara foi coisa de criança, os apitos da CNAF e da Vale foram coisas de deixar o Brasil de boca aberta; isso sem falar nos casos do Acre, de arrepiar os cabelos!

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