São Paulo, domingo, 18 de maio de 1997 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
País nada ganha com Alca, diz industrial
CLÓVIS ROSSI
Iniciar agora ou mais adiante a negociação para reduzir ainda mais as tarifas de importação pode não ser o mais importante, acha Salej. "As empresas brasileiras, salvo raras exceções, não têm marcas internacionalmente reconhecidas, nem redes de comercialização externas, nem investimentos em ciência e tecnologia", diz o empresário, esloveno de nascimento. Logo, mesmo que os Estados Unidos abram seus mercados, a penetração de exportações brasileiras será limitada. US$ 2 bilhões a mais O presidente da Fiemg faz uma pergunta provocadora: "Suponhamos que, de uma hora para outra, os Estados Unidos abram totalmente o seu mercado para o Brasil. Exportaríamos uns US$ 2 bilhões a mais. E daí?". Essa é a pergunta central. Os produtos tradicionais (suco de laranja, produtos siderúrgicos, calçados e têxteis), cuja importação do Brasil os norte-americanos barram utilizando artifícios variados, podem se beneficiar com a queda das barreiras. Acrescentariam, pelos cálculos do Ministério da Indústria, Comércio e Turismo, os US$ 2 bilhões citados por Salej. Mas o país não está preparado para tornar mais rica a sua pauta de exportações, de forma a abocanhar fatias mais suculentas do mercado norte-americano. No sentido inverso, é exatamente o contrário. Basta tomar o caso da informática. Uma pesquisa feita pela consultoria Price Waterhouse e divulgada na terça-feira passada mostra que 68% dos programas de computador em uso no Brasil (o software) são pirateados. Mostra, ainda, que a produção latino-americana de software cobre apenas cerca de 6% a 8% do mercado. Logo, se houver uma abertura também na informática, o Brasil não vai exportar um centavo a mais para os EUA, mas vai importar bilhões de dólares nesse que é um dos setores mais dinâmicos da economia moderna. 2005, perto demais Salej não está sozinho nessa constatação. Não significa, entretanto, que ele defenda o fechamento da economia nos parâmetros atuais. Nem mesmo o PT, ou ao menos o seu líder histórico, Luiz Inácio Lula da Silva, o faz. Ao falar, no dia 10 passado, em seminário de personalidades de esquerda e centro-esquerda da América Latina, Lula disse não ser contra a abertura da economia, mas contra uma abertura que só beneficie os empresários e não também os trabalhadores. O dilema político brasileiro, em matéria de comércio internacional, é justamente esse: todos ou quase todos admitem que a Alca é inevitável, mas poucos se animam a desenhar cenários nos quais a constituição dessa portentosa área de livre comércio possa ser benéfica para o Brasil. Talvez por isso tenha se criado, nas discussões prévias em torno da Alca, uma coalizão virtualmente inédita entre governo, empresários, sindicalistas e partidos de oposição. Todos batendo na tecla de que a Alca deve ser construída gradualmente, de modo a deixar para o fim a negociação de novas aberturas comerciais, para dar tempo ao país de se preparar. As reflexões de Stefan Bogdan Salej sugerem que, talvez, o tempo pedido seja insuficiente. No horizonte que hoje se pode ver, o Brasil dificilmente estará, até 2005 -a data tentativa para criação da Alca- em condições de competir com os Estados Unidos. Com o detalhe agravante de que a competição não será apenas no mercado norte-americano, mas em pleno território brasileiro. Texto Anterior: Lei prevê a manutenção de subsídios Próximo Texto: Setor de transformação perde US$ 17,7 bi Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |