São Paulo, domingo, 18 de maio de 1997
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"Custo Brasil": um gigantesco obstáculo

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

Se a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) fosse formada hoje, o novo bloco econômico cobriria uma população de 750 milhões de pessoas e um PIB de US$ 8 trilhões, o que significa uma renda per capita de US$ 10,6 mil -o triplo do que o Brasil tem hoje.
São números animadores. Mas, é claro, triplicar a nossa renda per capita vai muito além de uma mera operação aritmética. Isso exige um esforço monumental.
Uma área de livre comércio é de grande utilidade para aperfeiçoar a produção e melhorar a competição. A eliminação de barreiras alfandegárias e não-alfandegárias força comportamentos engenhosos.
Faz aumentar a diversidade de bens e serviços. Melhora a sua qualidade e reduz os preços, o que, por sua vez, alavanca a demanda, aumenta os investimentos, amplia as exportações e, consequentemente, o emprego.
Os desdobramentos sociais disso tudo são preciosos. Um povo empregado e bem alimentado vive melhor. Sabe avaliar a realidade. Valoriza as instituições. Ajuda a modificá-las. E, portanto, fortalece a democracia. Uma sociedade democrática tem mais chance de eliminar a impunidade, a exploração humana, o crime, a droga e tantos outros males que afligem a humanidade.
É impossível imaginar um quadro mais róseo do que esse. Mas os desafios para participarmos da Alca são colossais. Os Estados Unidos e o Canadá contam com um poderoso aparato científico-tecnológico e uma população de 300 milhões de habitantes superiormente educados e preparados para criar.
Além disso, dispõem de um sistema financeiro que apóia a produção, ajuda a criar empregos e pratica juros civilizados. Tudo isso pesa muito na competitividade daqueles países.
O Brasil, para se tornar um "global player", terá de acelerar e melhorar a eficiência dos investimentos em ciência, tecnologia e educação.
O salto de competitividade do setor privado depende ainda da conduta do governo nos campos da infra-estrutura, portos, juros, tributos, previdência social, legislação trabalhista e, enfim, em tudo aquilo que determina esse verdadeiro Muro de Berlim que é o famigerado "custo Brasil".
A superação desses entraves é condição essencial para o Brasil poder competir com as nações mais ricas -não em pé de igualdade, pois isso seria ilusório, pelo menos no curto prazo, mas tirando proveito das suas vantagens comparativas.
O "custo Brasil" é realmente o maior obstáculo à nossa modernização. A bola continua com os nossos governantes. A reunião da Alca evidenciou o que já se sabia: cabe a eles a responsabilidade histórica de nos colocar no mundo da competição ou de nos condenar às trevas da estagnação.
Que pena que a reunião não foi em Brasília! Ali, os poderes constituídos teriam tido chance de ver de perto o dever que lhes cabe perante as próximas gerações.

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