São Paulo, sexta-feira, 23 de maio de 1997
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A hora e a vez do teatro

JOSÉ SARNEY

Volto ao tema que foi e é minha causa parlamentar: a cultura. Não podemos deixar de reconhecer que há um vento novo de restauração, depois dos anos negros que se seguiram ao governo Collor, que revogou os incentivos culturais.
O ministro Francisco Weffort compreendeu bem a filosofia de colocar a cultura entre as preocupações de nossa sociedade industrial e a necessidade de produção de bens culturais. Tem feito um trabalho reconhecidamente bom.
Não se pode, todavia, atacar todos os setores ao mesmo tempo com a quimera de que andem paralelos. O renascimento do cinema é extraordinário. Estão rodando, segundo me informam, 200 filmes de longa metragem, e o que hoje está difícil no mercado são atores, técnicos e todo o pessoal necessário a uma indústria que tão bem conjuga mão-de-obra e inteligência. Nela, há pleno emprego.
É responsável por isso a Lei do Audiovisual, proposta pelo Ministério da Cultura, bem estruturada e bem concebida. Ela teve como coordenadores, no Legislativo, a então deputada Roseana Sarney e o relator, senador Alexandre Costa, do Maranhão, que muito melhoraram o projeto, sob a vigilante presença do lutador e grande defensor do cinema Luiz Carlos Barreto.
Resta o problema das artes cênicas. O teatro está numa situação de desamparo e deve ser protegido, quando surge o "boom" cinematográfico. O mesmo acontece com as outras modalidades das artes cênicas: a dança, o circo, a ópera.
Já Carlos 3º, em 1783, estabelecia uma lei sobre teatro e dizia que ele "era imprescindível aos povos cultos". O teatro é emblemático para aferir o nível cultural de um povo. Do que ficou da cultura da antiguidade, uma considerável parte é o legado teatral. Ainda hoje, em qualquer lugar do mundo, representam-se peças gregas e romanas, isso sem falar na milenar tradição oriental do kabuki e todas as manifestações teatrais do Oriente.
Da literatura inglesa, o mais visível, permanente e eterno é Shakespeare. Júlio César, a cada dia, morre de novo nos palcos em que sua tragédia é representada, em alguma parte do mundo.
Os Estados Unidos têm em Tennessee Williams um carro-chefe de sua marca cultural. Corneille e Molière, para só falar dos clássicos, continuam vivos como expressão maior da cultura francesa. As grandes atrizes e atores, músicos, cantores, bailarinos são representativos, no seu conjunto, do patrimônio artístico de uma nação.
Se quisermos saber qual o nível cultural de um país, perguntemos pelo seu teatro. Se o teatro vai mal, nem tudo vai bem. O teatro é uma arte germinativa. Dele saem os grandes nomes da televisão e do cinema.
É necessária uma lei igual à do cinema para as artes cênicas. Bastaria usar a que já existe e o governo ampliar os quantitativos de renúncia fiscal a ela destinados. Também faz falta uma lei de mecanismos e incentivos às artes cênicas.
Vou repetir: não podemos ser uma potência econômica e política, de expressão mundial, se não formos uma potência cultural, e o teatro, a ópera, a dança são indicadores. Agora, mais do que nunca, é a hora e a vez do teatro, da ópera, da dança, do circo.

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