São Paulo, domingo, 25 de maio de 1997
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Falso sem-teto invade e vende imóveis

LUCIA MARTINS
DA REPORTAGEM LOCAL

Existe um grupo de "agentes imobiliários" em São Paulo que se mascaram de sem-teto, invadem propriedades privadas ou do Estado e depois vendem os imóveis para terceiros -na maioria das vezes sem informar que se trata de uma área ou imóvel invadido.
A presença desses oportunistas é registrada pela prefeitura, pelo Estado e pelo Ministério Público. Não há levantamentos, mas os órgãos responsáveis registram muitos casos -a maioria se transforma em processos demorados e de difícil solução.
O Ministério Público de São Paulo tem, pelo menos, dois grandes casos que se arrastam por cerca de dez anos e são bons exemplos de como os "agentes imobiliários" agem. Caso 1: Na década de 80, um loteamento na zona de mananciais (perto da represa Billings, zona sul) pertencente à prefeitura foi invadido. Em 1992, segundo a investigação dos promotores, a área (de 15 mil m²) foi reloteada clandestinamente e vendida.
O processo aponta uma pessoa (conhecida apenas por José Paraíba) como a responsável pela "venda". Hoje, o loteamento é quase totalmente ocupado por casas de pessoas que compraram os terrenos com escrituras "frias".
Os lotes custaram, na época, CR$ 85.000,00 (o valor não é atualizado).
Ação civil
A investigação é demorada e difícil de ser implementada, e o Ministério Público poderá abrir uma ação civil pública contra o José Paraíba (leia texto ao lado).
Ele ainda pode ser processado pelos compradores -muitos deles enganados- com base no Código de Defesa do Consumidor.
"Mas o terreno nunca mais voltará para a prefeitura. É um problema social. Há pessoas precisando de casas, mas também há oportunistas. E as chances para eles se aproveitarem são grandes. É um saco de gatos", diz o promotor de Habitação e Urbanismo Mario Malaquias.
Santo Amaro
Caso 2: no final dos anos 80, um terreno particular -em Santo Amaro, zona sul de SP- de cerca de 1 milhão de m² é invadido.
Os proprietários não conseguem retirar os invasores. O terreno é reloteado e vendido. Nesse caso, o Ministério Público não identifica nem o nome do "vendedor". São objetos de possível punição os administradores regionais da época. Eles respondem por falta de fiscalização. Mas não há esperança de o dono recuperar o terreno.
Esses são os dois casos que, pelo menos, estão sendo objeto de investigação no Ministério Público. A maioria, no entanto, acaba ficando parado nos órgãos municipais e estaduais.
A CDHU (responsável estadual pela construção de casas populares) "tem registros de casos de vendas de imóveis invadidos, mas tudo foi encaminhado aos órgãos competentes", diz a assessoria de imprensa.
Procurada pela Folha, a prefeitura não forneceu os casos de venda de áreas invadidas.
"Existe uma indústria das invasões e da favelização que usa como modelo o Borel (favela na zona norte do Rio) e a Baixada Fluminense. Queremos casas boas, decentes, em vez de guetos", afirma Elias Costa, promotor de Habitação e Urbanismo do ABC, que pediu de dissolução judicial do MST (Movimento Sem-Terra) de Santo André, que é acusado de invadir e vender lotes no ABCD.

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