São Paulo, domingo, 25 de maio de 1997
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A pedra eterna

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - No seu artigo de ontem, pergunta o embaixador Rubens Ricupero, ministro da Fazenda quando do lançamento do Real e hoje secretário-geral da Unctad (agência da ONU para comércio e desenvolvimento):
"Por que não somos capazes de terminar o que começamos?"
O sujeito oculto da frase é o Brasil e o ex-ministro estava cobrando as famosas reformas estruturais.
Mas bem que Ricupero poderia generalizar a pergunta. O Brasil parece, de fato, incapaz de terminar o que quer que seja, inclusive a sua própria construção como nação digna desse qualificativo.
O país parece incapaz de chegar ao fundo das coisas. As incontáveis CPIs que foram criadas desde a redemocratização levantaram problemas igualmente incontáveis. Exemplo: a do Collorgate, que revelou a tremenda promiscuidade entre os cofres públicos e interesses privados.
E daí? Puniu-se um presidente por falta de decoro, o que não é desprezível, mas é pouco. Se faltou decoro no palácio, faltou decoro igualmente fora dele, nos gabinetes empresariais em que se teceu a rede de corrupção.
Mas, como nada aconteceu, vira e mexe aparecem de novo problemas de natureza idêntica ou, ao menos, parecida. Como o escândalo da compra de votos para a reeleição, em que, de novo, empreiteiras aparecem na ponta da linha.
Vire-se o foco para a polícia e chega-se ao mesmo ponto. Chocado pelos episódios de Diadema, o governador Mário Covas propôs uma radical alteração no esquema de policiamento.
E daí? Alguém voltou a falar no assunto, embora a PM tenha reincidido, como tudo leva a crer, ao desalojar sem-teto na zona leste paulistana?
O Brasil parece o poema de Drummond, aquele do "no meio do caminho tinha uma pedra". Pena que, em vez de removê-la, dinamitá-la, implodi-la, o país prefira apenas contorná-la, como se ela fosse sumir magicamente.

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