São Paulo, domingo, 1 de junho de 1997
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O sexo oral que abala o mundo

GILBERTO DIMENSTEIN

Os cachês de shows de strip-tease nos palcos americanos não param de bater recordes.
Uma estrela do strip-tease consegue ganhar até US$ 80 mil por mês -o que nosso professor universitário teria de suar mais de três anos para conseguir.
A revista "US News & World Report" encontrou a explicação para esses salários milionários. Levantou o faturamento de peças teatrais. Depois comparou com a arrecadação dos 2.500 clubes de strip do país.
Venceu, longe, a demanda por mulher pelada. A reportagem pôs na balança, ao lado das peças, os concertos -de jazz, passando por ópera, até música clássica. Nem assim.
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Esses números mostram a gravidade de uma crise política detonada semana passada nos EUA.
O presidente Bill Clinton está prestes a ser pisoteado pela obsessão sexual americana. A prosperidade da indústria da pornografia é apenas sintoma da onda moralista, explicável pela formação religiosa americana, agregada à mudança de costumes provocada pela Aids e pela histeria feminista.
A crise foi detonada com a decisão da Suprema Corte de permitir que Bill Clinton fosse processado por Paula Jones. Ela jura que, há seis anos, Clinton, então governador, convidou-a para subir a um quarto de hotel, baixou as calças e convidou-a para praticar sexo oral.
Quer um pedido público de desculpas e mais a indenização de US$ 700 mil para tirar o processo. Se o presidente aceitar, equivale, na prática, a um reconhecimento de culpa.
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Principal jornal de economia do mundo, o "The Wall Street Journal" afirmou, quinta-feira passada, que está em risco a governabilidade Bill Clinton.
Numa adaptação aos tempos, o novo conceito de estupro não implica necessariamente uso da força física. Bastaria provar que o homem (ou mulher) se aproveitou da hierarquia e do poder, num ato de coação sexual.
Por esse conceito, Clinton seria uma espécie de estuprador. Teria usado seu cargo para induzir Paula ao sexo oral.
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Ela promete provar o que diz e, inclusive, revelar marcas íntimas de Clinton. Obrigaria, assim, o presidente a fazer exames físicos. Há muito mais.
O advogado de Paula afirma que vai fazer desfilar pelo tribunal dez mulheres cantadas por Clinton, já casado.
Lembre-se do escândalo do mês. Acusada de adultério, Kelly Flinn, primeira mulher a dirigir um bombardeiro B-52, foi duramente punida. Note que ela era solteira, enganada pelo indivíduo que tinha prometido casamento.
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Analistas políticos dizem que, mesmo que ela não prove nada, o presidente terá passado por um devastador strip-tease, jogado sem roupa à opinião pública.
Há alguns tipos de punições que ocorrem apenas pela existência da suspeita debatida publicamente.
Imagine a cobertura jornalística caso o presidente passe por um exame físico para conferir os sinais íntimos supostamente visualizados por Paula Jones.
Pela primeira vez da humanidade, um pênis presidencial mereceria tamanha exposição pública. Engraçado?
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De acordo com o "The Wall Street Journal", o caso traz o risco de minar as chances de maior permanência dos democratas na Presidência, frustrando os projetos de sucessão do vice Al Gore.
Tem-se, portanto, uma crise de repercussões mundiais, a ser acompanhada por executivos de multinacionais, chefes de nações, militares e diplomatas.
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Por falar em crise, passei a semana passada no Brasil. Apesar da chuva de escândalos, colhi mais sinais de que a agenda nacional progride. Mais por culpa da sociedade do que do setor oficial.
Em Curitiba, presenciei jornalistas que separaram três dias para debater direitos humanos. Na cidade, conheci alunos do Colégio Bom Jesus, uma escola privada, que ajudam crianças de escolas públicas.
Em São Paulo, vi policiais, num encontro do projeto Viva o Centro, debatendo como tornar compatíveis direitos civis e segurança. Ali, aliás, sindicato de bancários e bancos montaram projeto (Travessia) para tirar as crianças da rua.
A Blockbuster resolveu emprestar gratuitamente a seus clientes documentários, com temática social brasileira.
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PS - O que mais me impressionou foi a exposição de um diretor da Fiesp, Horário Piva. Reuniu-se com centenas de professores, no domingo, e falou apenas sobre educação. Disse que, hoje, é mais relevante discutir defasagem educacional do que defasagem cambial.
Insisto: o país está ruim, mas nunca esteve tão bem.

Fax: (001-212) 873-1045
E-mail gdimen@aol.com

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