São Paulo, segunda-feira, 9 de junho de 1997 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
"O Lago" ganha releitura radical
ANA FRANCISCA PONZIO
Hoje, no evento "Babel", promovido pelo Sesc, estréia mais uma, desta vez de autoria de Marcelo Gabriel, coreógrafo e diretor do Grupo Dança Burra, de Belo Horizonte. Na radical releitura de Gabriel, "O Lago" ganhou o título de "O Anti-Homem" e, em vez de bailarinas etéreas interpretando seres sobrenaturais, mostrará um personagem solitário, expressando opressões urbanas e contemporâneas. "A beleza de 'O Lago dos Cisnes' sempre me impressionou. Apesar de sua plasticidade e da riqueza psicológica de seus personagens, esse balé costuma ser visto de forma simplista e estereotipada", diz Gabriel. "Em minha versão, aproveitei a questão dos relacionamentos humanos, suscitada pela obra original, para estimular uma intersecção entre culturas clássica e popular. Tentei me desarmar ao máximo para realizar um espetáculo despojado, situado num contexto atual, em que o homem vive e reinventa-se em função das grandes cidades", prossegue. Durante o processo criativo de "O Anti-Homem", Gabriel inspirou-se em um cisne confinado em uma gaiola. Dessa imagem, retirou elementos para inscrever, no subtexto do espetáculo, dicotomias entre feminino e masculino, matéria e espírito, arte e pragmatismo. "Também misturei conceitos nietzschiano com budismo, que me levaram a explorar o vazio e a ausência. Coreograficamente, tento lidar com o silêncio interno do corpo." Em busca de novos códigos de linguagem, Gabriel tenta burlar a linguagem cartesiana da dança que, em sua opinião, esteriliza o artista. Por isso, seus laboratórios criativos incluem a observação e o contato com pessoas das ruas, principalmente os que vivem marginalizados, como os sem-teto ou as prostitutas. "Saio pelas ruas e chamo essas pessoas para dançar, pois elas trazem imantado um anticorpo criativo muito forte. Acredito que a vida está nas ruas e não dentro dos estúdios", afirma Gabriel que, no entanto, não descarta os recursos técnicos do balé clássico. "Sempre fiz dança clássica, só que procuro não me submeter a regras massificantes. Procuro obedecer à organicidade de meu corpo, comportando-me como um criador e não como um executor de passos." Em "O Anti-Homem", a música criada por Tchaikovsky para "O Lago dos Cisnes" aparece fragmentada, em meio a composições eletrônicas de Laura Finochiaro, Adriano Cintra e do próprio Gabriel. Mais próximo do teatro da crueldade de Antonin Artaud do que da obra coreografada por Marius Petipa no século passado, "O Anti-Homem" se soma ao repertório contestador de Gabriel, que vem se destacando entre os novos criadores da dança brasileira contemporânea. Espetáculo: O Anti-Homem Com: Marcelo Gabriel Quando: hoje, às 21h Onde: Sesc Pinheiros (r. Paes Leme, 149, s/ tel., Pinheiros, zona oeste) Quanto: grátis (convites devem ser retirados com antecedência no local ou no Sesc da av. Rebouças, 2876, tels. 211-8602 e 210-9150) Texto Anterior: Cineasta autopsia angústia da atração amorosa Próximo Texto: Em "Tributo a Pixinguinha" Bocato dá toque jazzístico ao compositor Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |