São Paulo, quarta-feira, 18 de junho de 1997
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O jantar de Covas com Lula

ELIO GASPARI

O jantar de FFHH com Paulo Maluf foi um golpe de mestre. Ecoa a velha frase de Getúlio Vargas: "Não tenho inimigo de quem não possa me aproximar, nem amigo de quem não possa me distanciar". Como Vargas, FFHH tem um projeto grandioso para o país que passa, necessariamente, pela sua permanência no poder. Esse é o fio condutor de todo o arcabouço político de seu primeiro mandato e esse foi o propósito do encontro do Alvorada. Dele, não resultará a entrada de Maluf para o governo, mas ele certamente levará ao abrandamento da oposição que lhe faz. É uma oposição desconexa e utilitária, mas, mesmo assim, incômoda, porque ameaça a coesão da base conservadora do reinado.
FFHH teve a coragem de dar seu passo. A grita do PSDB é comovente, mas situa-se no campo exclusivo das emoções e dos afetos traídos. O caso do governador Mário Covas é exemplar. Em 1994, quando a campanha do professor Cardoso fazia água, a teimosia de Covas significou um dos poucos apoios seguros com que contou. Três anos depois, quando Covas faz água, FFHH lança pontes em direção ao malufismo. São coisas da vida, mesmo que se deva reconhecer que não há registro de guinada semelhante na biografia de Covas.
Jogar pedras no presidente por conta de sua aproximação com Maluf é um exercício tão inútil quanto reclamar do condomínio que formou com o PFL. O governo é dele, faz os pactos que bem entende. Aliou-se ao PFL em 1994, formou o condomínio em 1997, e não há notícia de grão-tucano que tenha pensado em romper por conta disso. Romper com FFHH significa ir para a oposição e ficar longe das chaves do cofre. Se isso fosse pouco, FFHH cavalga a popularidade presidencial mais duradoura já registrada em sua geração. (Noves fora o general Médici durante o "milagre" dos anos 70.)
Quando um tucano reclama dos rumos de FFHH, de duas uma: ou está praticando um exercício de romantismo, ou está querendo enganar sua platéia. A pergunta é outra: quem vai romper?
No ano passado, quando o então prefeito de São Paulo disse que "Fernando Henrique, na versão vitoriosa de 95, é o Paulo Maluf derrotado de 85", pensou-se que estava exagerando. Estava, mas não tanto. As diferenças hoje existentes entre os dois não justificam uma distância tão grande que leve FFHH a arriscar um pequeno pedaço de sua reeleição para preservar sua aliança histórica com Mário Covas. Se o preço de uma campanha tranquila for a vitória de Maluf em São Paulo, FFHH paga, e Covas fica com a conta.
Convencionou-se que o desempenho do governador de São Paulo vem sendo medíocre, o que é uma simplificação. Covas é um desastre pessoal que carrega um sucesso público. Faz tudo errado quando a sua PM espanca e mata cidadãos, mas no seu governo os índices de extermínio caíram a níveis nunca vistos. Sua política educacional é um sucesso de resultados e de iniciativas.
Covas não é promissória vencida. Não o é porque tem como se recuperar, e também porque nunca se deve ver num passo de FFHH, quase sempre para o lado, um avanço ou recuo definitivo.
Além disso, no campo da especulação, a política paulista, que sustentou o MDB do dr. Ulysses e criou o PSDB do professor Cardoso, pode trazer uma surpresa. Nada garante que ela aconteça, mas Luiz Inácio Lula da Silva tem um sonho. Nele, Covas chega a um tal grau de exasperação, que os dois se sentam para uma conversa e saem aliados. O PT apóia Covas na eleição estadual, e Covas se afasta discretamente da campanha presidencial. Impossível? Tão impossível quanto supor que FFHH pudesse vir a se distanciar da sucessão paulista em troca de um corpo mole de Maluf na campanha presidencial. Se acontecer, o jantar de Covas com Lula será um golpe de mestre.

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