São Paulo, sexta-feira, 20 de junho de 1997
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Canal francês TF1 determina o hit do verão

FRANCIS CORNU e SYLVIE KERVIEL

FRANCIS CORNU; SYLVIE KERVIEL
DO "LE MONDE"

Não é porque nesses lugares se mexe com tecno, dance e outras frivolidades que se pode entrar neles como se fossem qualquer bar de esquina.
À sombra do orgulhoso edifício da emissora de TV francesa TF1, é preciso mostrar os documentos antes de penetrar nos escritórios da Une Musique.
É normal -afinal, trata-se de um laboratório onde se fabricam sucessos, dos grandes. Pierre-Yves Garcin, diretor-comercial dessa filial da TF1, e Frédéric Delliaux, diretor de promoção, são engenheiros de altíssimo nível, os engenheiros dos grandes sucessos.
São donos da receita do verão, "Alane", que vai fazer a França -e, quem sabe, o mundo- dançar ao ritmo da sanza. Não se trata de uma simples probabilidade, mas de uma quase certeza.
Sua ciência é quase exata. Eles reuniram todos os ingredientes do sucesso. A "Operação 1997" junta a multinacional do disco Sony Music, a TF1 (claro), a RTL e a Fun Radio para garantir que se atinja todos os públicos.
Para finalizar, um patrocinador, já que empreendimentos desse tipo custam caro: o café Malongo.
Entre 12 de maio e 1º de setembro, o videoclipe "Wes", do camaronês Wes Madeko, terá sido transmitido pela TF1 pelo menos 550 vezes. Seria preciso ser surdo e cego para ficar indiferente a isso.
Esse empreendimento não deixou nada para o acaso, chamando os melhores nomes para ter êxito. Foram convocados desde Michel Sanchez, compositor do Deep Forest, até Todd Terry, o remixador de Michael Jackson, e, para a dança, a coreógrafa de "Macarena", a americana Mya Frye.
Em meio a tudo isso, o fato de o cantor Wes Madeko ser desconhecido não tem importância nenhuma. Todos os especialistas dizem o mesmo: uma "revelação" é até preferível.
Pierre-Yves Garcin e Frédéric Delliaux conhecem todos os elementos da alquimia do marketing bem-feito. É claro que não se esqueceram da promoção nas discotecas, onde tudo já foi providenciado para que se possa aprender os movimentos da sanza.
"Top 50"
"Alane" já está no sétimo lugar dos "Top 50", o que significa que são vendidos entre 8.000 e 11 mil singles por dia. Já foi lançado em meia dúzia de países e chegará aos EUA em junho.
"Alane" é um produto obrigatoriamente bem-acabado. Trata-se de uma simpática mecânica metade africana, metade ocidental, que convida o ouvinte a cair na dança.
"Descomplicada", diz Corinne Bouygues, executiva-chefe da Une Musique e do departamento publicitário da TF1, explicando que "Alane" corresponde perfeitamente à world music que a emissora quer privilegiar: "Um misto de música étnica, tecno e dance".
A TF1 está preocupada com os mais jovens, que teriam dado mostras de infidelidade à emissora.
O presidente da TF1, Patrick Le Lay, estaria insatisfeito com as pesquisas relativamente estetizantes empreendidas nos últimos dois anos e teria pedido que fossem enfatizadas composições que "não cansam a cabeça".
O "número dois" da emissora, Etienne Mougeotte, deixou claro quais são as diretrizes para 97: "Uma música que seja ainda mais dançante que o normal".
Concorrência
Se a TF1 está investindo tanto, é porque a concorrência está especialmente forte em 97. A France 2 está lançando "Mana", de Siva Pacifica, com a cantora Robyn.
Até 25 de setembro, esse videoclipe será exibido cerca de 300 vezes. Nele, "vahines" (moças polinésias) vestindo ridículos sutiãs feitos de coco ondulam graciosamente à beira de uma lagoa. Mais verão do que isso, impossível.
Uma diferença, no caso de "Mana": "Não há nenhuma dança específica ligada à canção. Ela não tem nada em comum com a 'Macarena'. Em 96, 'Tic Tac', do grupo brasileiro Carrapicho, foi um sucesso imenso, mas a coreografia era um pouco brutal. A canção se saiu melhor não na TV, mas nas discotecas", diz Sophie Lapidus, responsável pelo departamento de variedades da France 2.
É a primeira vez que a emissora France 3 entra na onda do verão, com "Amaria", interpretada por Les Mammas, um grupo de quatro mulheres de diferentes nacionalidades mediterrâneas.
O disco foi distribuído pela BMG e patrocinado pelas massas Panzani. Alain Vautier, diretor artístico e responsável pela unidade dos programas de entretenimento, observa que a demanda da indústria dos discos é grande:
"As grandes gravadoras querem promover músicas que se tornem referências do verão. Há uma pressão vinda delas. Mas o disco do Les Mammas realmente nos seduziu. Gostamos dele porque, por trás da operação comercial, existe um sentido verdadeiro. Há uma dança também, mas não queremos transformá-la na dança do verão".
Como a France 2, a France 3 não dispõe de tantos meios quanto a TF1, mas ela espera "pelo menos equilibrar gastos e lucros".
A M 6 tem outras ambições: é o "canal musical" que pode acabar representando uma ameaça à TF1. Robin Leproux, diretor da M 6 Interaction, ressalta que, em função da característica principal da emissora, "é indispensável ser líder nas operações do verão".
Ricky Martin
A M 6 apostou num artista conhecido, o porto-riquenho Ricky Martin, que já vendeu milhões de discos na América e na Espanha. Na França, "Maria" ocupa o primeiro lugar no ranking dos "Top 50" há dez semanas (800 mil cópias vendidas).
Talvez a M 6 tenha começado cedo demais. A escolha foi decidida ainda no início de janeiro. "Corremos o risco de ficarmos superexpostos", reconhece Leproux. "Mas temos que segurar até o fim do verão."
Como a emissora veicula muitos clipes, ela calcula que não precisa associar-se a rádios, mas fica contente porque a NRJ já criou uma paródia da canção de Ricky Martin. É o preço do sucesso.
Até mesmo o canal Arte entrou no jogo. Apenas a emissora Canal Plus se nega a tomar parte nessa disputa. "Esse tipo de operação não faz parte de nossa maneira de apresentar música", diz um representante da direção da emissora.
As emissoras envolvidas guardam segredo sobre o aspecto financeiro, afirmando que devem isso a seus parceiros.
É claro que essas operações custam caro, quando não muito caro. Mas a repentina multiplicação das operações corre o risco de provocar uma saturação do mercado, segundo o produtor independente Gilbert Castro, apontando que a rentabilidade da publicidade de discos se encontra em baixa.
Mas os profissionais dos sucessos de verão já começam a traçar suas estratégias para 1998. Enquanto isso, o jeito é aprender a dançar conforme as músicas do momento.

Tradução Clara Allain

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