São Paulo, segunda-feira, 23 de junho de 1997
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O macaco e o galho

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Não incluo o patriotismo entre as minhas poucas e discutidas virtudes. Mesmo assim, fiquei inchado de orgulho cívico, há tempos, quando soube que o Brasil, a Bolívia e o Paraguai haviam assinado soleníssimo documento garantindo à comunidade internacional que jamais usariam a energia nuclear para fins que não fossem pacíficos.
Semana passada, o Brasil curvou-se mais uma vez à globalização. Vai assinar o tratado contra a proliferação das armas nucleares -vinha resistindo a isso, achando que dito tratado beneficiava os poucos países que já detêm arsenais atômicos.
O argumento que era dado tinha a sua lógica: o tratado eterniza o status quo em matéria de poderio nuclear. Quem tinha, teria sempre. Quem não tinha, que continuasse fabricando estrelinhas e busca-pés para as festas juninas.
Antes que acusem o cronista de defender o genocídio nuclear, deixo claro que também sou contra o uso desse tipo de arsenal para defender ou atacar seja lá o que for -o que, de resto, não influi para mais ou para menos na questão.
Aproveito apenas a ilação: assim como o tratado contra a proliferação das armas atômicas beneficia o restrito grupo das potências que já dispõem de bombas nucleares, a globalização tende a privilegiar para todo o sempre os países que já superaram o problema da miséria, da doença e da instabilidade política.
Globalizar é manter o status quo não apenas na corrida nuclear, mas na corrida econômica e social. Quem chegou lá, que lá fique e peça compreensão aos que ainda se esbofam para atingir o mesmo patamar de desenvolvimento.
O raciocínio é o mesmo. Assim como a proliferação das armas nucleares pode bagunçar o equilíbrio militar e estratégico do mundo, a luta pela superação da pobreza pode prejudicar o butim da economia mundial. Daí que cada macaco deve ficar no seu galho.

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