São Paulo, segunda-feira, 23 de junho de 1997
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A opção menos ruim

JOSÉ SERRA

Um dos bons equívocos da vida política brasileira neste fim de século foi cometido há pouco menos de quatro anos, quando se decidiu iniciar a revisão constitucional um ano antes da eleição. A Constituição havia determinado sua própria revisão a partir de 5 de outubro de 1993, mas não havia obrigação alguma de que o processo fosse iniciado nessa data.
Com o Congresso esfrangalhado pelo esforço para a cassação de Collor e pela CPI do Orçamento (que começaria no fim do ano) e excitadíssimo pela incerta campanha eleitoral, que já começava, a revisão, evidentemente, não andou.
Uma oposição pequena, mas aguerrida, a elevadíssima taxa de absenteísmo e o horror de votar temas que colocassem em risco o possível colégio eleitoral de cada parlamentar, transformaram a rápida, drástica e massiva revisão da Constituição num parto da montanha.
O que deveria ter sido feito? Obviamente, marcar a revisão para o primeiro ano depois das eleições. Mas isso não aconteceu, em face do receio de alguns setores políticos de que Lula ganhasse a eleição presidencial e, a partir daí, moldasse a Constituição segundo as concepções da esquerda!
Do mesmo modo, a ignorância sobre os aspectos mais conflitivos da reforma constitucional (a reforma administrativa mal era citada no elenco das mudanças necessárias) permitiu subestimar a resistência à revisão.
E, simetricamente, superestimou-se o poder de mobilização das elites econômicas para forçar as mudanças constitucionais por cima dos interesses dos parlamentares sequiosos de reeleger-se. Por fim, acreditou-se que, sem reformar profundamente a Constituição, não seria possível lançar a estabilização da economia...
Desperdiçada a revisão e diante de uma Constituição prolixa, detalhista, eivada de nós corporativistas e jurídicos que tanto amarram o país, a tarefa de reformá-la foi retomada pelo novo governo, em 1995. Mas, então, pela via normal das emendas, ou seja, maioria de três quintos, comissões prévias e quatro votações em plenário; processo diluído no tempo, na base da estratégia caça-frango em quintal: uma mudança aqui, outra acolá, numa reforma permanente, desgastante e paralisadora.
De fato, até agora, só foi possível mudar a ordem econômica: extinção de monopólios estatais e de reservas de mercado, não mais do que 10% das mudanças necessárias. O resto, ao sabor das pressões e contrapressões da conjuntura política, foi virtualmente paralisado.
É possível ainda, com excepcional esforço, aprovar algo da reforma administrativa e avanços no texto da previdência. Mas muita coisa ficará faltando, nessas áreas, nos campos tributário, político e jurídico. Parece intolerável, porém, que o novo governo, em 1999, seja de novo atado pelas reformas constitucionais.
A saída, qual a saída? Para mim, aprovar uma emenda constitucional, sujeita a referendo popular, convocando nova revisão, na linha da proposta do senador Pedro Simon. Difícil, cansativo? Sem dúvida. Mas trata-se da opção menos ruim.

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