São Paulo, segunda-feira, 23 de junho de 1997
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CPI para o caso Cpem

EDUARDO JORGE

Dentro e fora do PT muito se criticou o Lula por morar em casa emprestada e receber uma aposentadoria especial de R$ 2.000. Não há dúvida de que há alguma razão nesta crítica, porém vejamos os fatos por outro ângulo, também razoável.
Lula foi candidato ao governo de São Paulo, deputado federal constituinte, duas vezes candidato muito forte à Presidência da República. Num país onde muitos outros políticos enriqueceram em cargos públicos, ou mesmo com "sobras de campanha", deveria causar surpresa o fato de precisar morar numa casa emprestada por um amigo e mesmo precisar daquela aposentadoria para sustentar a família.
São sinais objetivos de que ele não roubou, não se beneficiou pessoalmente na sua trajetória política.
Muitas pessoas têm me procurado, a propósito dessas acusações de corrupção feitas aos dirigentes do PT, com o seguinte raciocínio:
1) Está claro e evidente que o governo federal (PFL/PSDB) tira proveito da situação e amplia artificialmente o episódio para fugir ao cerco que estava sofrendo no esclarecimento da compra de votos para a aprovação da reeleição. De quebra, procura enfraquecer preventivamente um possível adversário na campanha presidencial de 1998.
2) Independentemente dessa constatação, existe algo de verdade nas denúncias? O PT vai esclarecer a nós e à opinião pública de forma cabal, mostrando sua boa-fé e provando a correção dos seus procedimentos administrativos e políticos?
Temos a obrigação de nos preocupar com as pessoas que pensam assim. É necessário responder suas dúvidas e inquietações e não simplesmente desfilar nossa soberba de proprietários da verdade.
A quem interessa que o caso fique rápida e totalmente esclarecido? À direita? Ao governo PFL/PSDB? Não, para eles a forma como os meios de comunicação divulgaram o assunto já é praticamente um julgamento condenatório do PT. Esses partidos não moverão uma palha para um real esclarecimento do assunto. Que fique a dúvida, para eles é um grande lucro...
É o PT que tem de querer o total e mais profundo, mais público e mais independente julgamento a respeito.
Nesse sentido, a formação da comissão interna pela direção do partido é positiva, e o envio de suas conclusões ao Ministério Público, necessário. Porém são insuficientes. A primeira será considerada como "interna", e o segundo será, e deve ser, pelas suas características próprias, demorado.
Assim, qual é o palco político que permite uma avaliação ágil, com grande visibilidade e imediata repercussão? É a CPI no Congresso Nacional.
Sei das limitações desse instrumento institucional, porém fomos nós mesmos, numa posição às vezes inquisitorial, que construímos no imaginário popular o seu prestígio como "supremo tribunal político".
Agora que somos os acusados, recusamos o remédio que ajudamos a sintetizar e aplicar aos outros sujeitos políticos do país?
É impossível sair com coerência dessa situação sem atravessar essa barreira. Experimente responder diferentemente ao homem/mulher do povo.
E aquela tática de exigir uma CPI para todos os corruptores e todas as campanhas? Ora, nós estamos cansados de saber que ela não sairá agora, e lembro minha tese: somos nós, do PT, que queremos esclarecer tudo em relação a essas acusações.
E a outra tática, de exigir a CPI simultânea com a CPI da compra de votos da reeleição? Para o público, é evidente que terá o seguinte resultado: nem uma, nem outra. E mais, se há alguma chance de esclarecer este escândalo da compra de votos e barrar a reeleição, é realizar já a CPI da Cpem com as 300 prefeituras de PPB, PFL, PSDB, PT, PMDB etc. às quais prestou serviço. Com isso, FHC ficará nu, e a opinião pública não o perdoará jamais por ter impedido o esclarecimento da compra de votos na outra CPI frustrada.
E se, nesse processo, aparecer algum culpado entre os nossos? Ele terá que se responsabilizar. O que não é possível é condenar milhões de militantes, simpatizantes e eleitores do PT a arrastar essa acusação pelo resto da vida.
Alguns dizem: "O estrago está feito, vamos esperar a cicatrização". Eu digo: se a ferida não é bem tratada, a infecção pode se alastrar, ou a cicatrização final pode ser deformante.
O caminho de "absorver o golpe" agora e tentar escapar para a frente de alguma forma pode ser a trilha mais curta para "zerar o jogo" num patamar rebaixado da política.
Será que é esse o papel que sobrou para o PT?

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