São Paulo, domingo, 29 de junho de 1997
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Testemunha é ligada a lotérica suspeita

LUCAS FIGUEIREDO
AUGUSTO GAZIR

LUCAS FIGUEIREDO; AUGUSTO GAZIR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Antônio Vieira, cuja família possui a Camisa 10, onde o "anão" João Alves apostava, é peça chave no julgamento

Uma testemunha que reforça a tese de que o ex-diretor de Orçamento do Congresso José Carlos Alves dos Santos mandou matar a mulher, Ana Elizabeth Lofrano, tem ligações com um ex-deputado envolvido no esquema de desvio de verbas do Orçamento.
Em depoimento que consta do inquérito que apurou o crime, Antônio Carlos Vieira, 40, disse que na noite do desaparecimento de Ana Elizabeth viu o carro identificado como sendo o de José Carlos parado próximo a uma caixa-d'água no Lago Norte de Brasília.
Vieira afirmou ter estacionado par ver o que estava acontecendo, quando viu um lençol branco estirado ao lado do carro de José Carlos, indo embora em seguida.
O testemunho coincide com a descrição do sequestro feita por Lindauro da Silva, um dos assassinos confessos de Ana Elizabeth, que afirma ter cometido o crime a mando de José Carlos.
A família de Vieira é proprietária da casa lotérica Camisa 10, onde o ex-deputado João Alves fez a maior parte das apostas que lhe deram mais de 200 prêmios no valor de US$ 9 milhões.
Segundo a CPI do Orçamento, o número elevado de prêmios ganhos pelo deputado era indício de um esquema para "lavar" dinheiro desviado de obras públicas e programas sociais.
A Folha apurou que, do inquérito do Supremo Tribunal Federal que investiga o ex-deputado, constam cópias de cheques de João Alves para a conta pessoal do pai de Vieira, Homero Vieira, dono da Camisa 10.
"Ligação com o caso"
A Folha conversou com Vieira na casa lotérica da família, e pediu a ele que contasse o que tinha visto na noite do desaparecimento de Ana Elizabeth.
Nervoso, ele começou a fazer um desenho mostrando sua versão do fato. Depois, parou e espontaneamente começou a falar do ex-deputado João Alves.
"Não posso dar entrevista porque, de certa forma, minha família tem ligação com o caso. Meu pai fazia as apostas do patrão (João Alves) de José Carlos", disse Vieira.
Também sem ser questionado, expôs as razões pelas quais a Camisa 10 aceitava as apostas milionárias feitas pelo ex-deputado, que chegou a gastar US$ 800 mil em um único jogo e comprar 440 mil volantes por mês.
"João Alves era um grande apostador da casa, mas não sabíamos de nada, porque vinha tudo prontinho do Congresso. Nós começamos a desconfiar dele quando as apostas ficaram muito altas."
O pai de Vieira reconheceu ter feito apostas para João Alves de 1989 a 1991, mas afirmou não saber que o filho prestou depoimento no inquérito sobre a morte de Ana Elizabeth. "Estou surpreso. Existe uma coincidência, de fato, mas não tenho nada a dizer sobre isso."
Zacharias Mustafa Neto, promotor encarregado da acusação contra José Carlos, desqualificou o depoimento de Vieira. "Ele é maluco, mexe com negócio de zodíaco, de tarô. O depoimento dele não teve consistência."
O promotor não convocou Vieira para testemunhar no julgamento nem pediu que o depoimento dele fosse lido. Mas os jurados terão acesso ao depoimento.
"Poderiam questionar o fato de ele ser filho do dono da Camisa 10", afirmou Mustafa Neto.
O julgamento deve terminar hoje ou amanhã.
A acusação defende a tese que José Carlos mandou matar a mulher para ficar com Crislene Oliveira, uma de suas amantes.

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