São Paulo, domingo, 29 de junho de 1997 |
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Para Singer, reformas são 'luta de classes'
LUIZ ANTONIO CINTRA
* Folha - Como o sr. avalia esses três anos do Real? Paul Singer - Eu diria que nesses três anos o plano mudou. Na realidade, já terminou como plano de estabilização e terminou dando certo. Mas agora o plano mudou, no sentido de que o slogan Plano Real está sendo usado agora pelo governo para tentar fazer as reformas. O plano hoje é muito mais o conjunto de mudanças constitucionais e institucionais. Folha - E agora se põe tudo em cima das reformas. Singer - Essas reformas, na verdade, reproduzem hoje a luta política que também está acontecendo em outros países. Está acontecendo nos EUA, França, México, Argentina. É uma luta típica de classes. Ou seja, o empresariado está numa ofensiva para recuperar um espaço na sociedade, na economia, que tinha antes dos anos 30. É uma tentativa de voltar a uma situação em que todos os serviços públicos eram prestados por particulares com concessão, o que amplia a desigualdade social. É por isso que o Real é altamente controvertido. Porque há um processo de degenerescência do trabalho, que está muito ligada à forma da estabilização, pela abertura de mercado, sobrevalorização cambial, pela alta taxa de juros e baixo nível de crescimento. Tudo isso combinado está dando uma hecatombe nos postos de trabalho da classe média. Folha - Mas no Congresso o sr. acredita que essa oposição está tendo algum sucesso? Singer - Acho que sim. Porque no mínimo as reformas administrativa e da previdência estão paradas. E chamar isso de corporativo é correto, é corporativo mesmo. Só que numa sociedade de classes tudo é corporativo. Eu acredito que essas reformas provavelmente serão decididas nas urnas em 98. Folha - Mas para a opinião pública uma derrota do governo nas reformas parece uma derrota do país. É a impressão que dá. Singer - Pois é, mas na França, com tudo isso, com uma mídia igual à brasileira, apoiando as reformas, os socialistas ganharam de longe. Na França, por exemplo, a grande mudança foi em dezembro de 95, numa greve só de funcionários públicos, lutando pelos seus direitos de funcionários públicos, e a população aderiu. E, quando as eleições foram convocadas, a direita esperava continuar com a maioria e não foi o que aconteceu. E isso pode se repetir no Brasil. Folha - Seria falta de perspectivas para a sociedade? Singer - Acho que não. Acho que se está prestando mais atenção ao outro lado. Ou seja, não basta liberalizar a economia para imaginar que se vá crescer e que isso vá beneficiar o conjunto da sociedade. Esse é o ponto central. Porque o que os empresários sustentam é isso: se eles puderem contratar sem ter que respeitar a legislação trabalhista, vão empregar muito mais gente. Mas isso é uma mentira. Acho até que eles não sabem que seja mentira. Porque eles olham no micro. Só que não percebem que venderiam menos produtos, se todos fizessem o mesmo. Folha - O sr. concorda com a idéia de que o Real favorece as grandes indústrias e deixa de lado o pequeno empresário? Singer - Na realidade, o plano virou isso. E não entramos ainda na discussão da reforma tributária, que será árdua. Existe um enorme conflito distributivo sobre o erário público. E o tema ficou para trás. É tão controvertido que o governo esqueceu a reforma tributária. Folha - E a estabilidade pode ter problemas? Singer - Do lado da estabilidade, o perigo é uma crise cambial. Estamos muito mais dependentes da entrada de recursos externos do que em 96 ou 95. Mas o governo pode ter razão e esses capitais podem continuar jorrando até 98, mas também pode ser que não. E ao meu ver isso depende de fatores completamente externos ao Brasil. E a alta dos juros em outros países pode desviar esses recursos. Desse ponto de vista, estamos profundamente desconfortáveis. Mas pode-se ficar desconfortável por vários anos e não acontecer nada. Texto Anterior: Justiça social é desafio de médio prazo para o Real, afirma Malan Próximo Texto: Privatização dá tempo ao governo, diz Bacha Índice |
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