São Paulo, domingo, 29 de junho de 1997
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O Real e a redução da pobreza no Brasil

CLAUDIO MONTEIRO CONSIDERA

A pobreza no Brasil vem-se reduzindo nos dois últimos anos. O quadro 1 esclarece essa situação: a proporção de pobres, que era de 33,4% em 1994, se reduz para 27,8% em 1995 e 25,1% em 1996.
Concorreram para isso o crescimento da renda "per capita" e o declínio no grau de desigualdade. O grau de desigualdade é calculado como o quociente da parcela de renda dos 20% mais ricos pela dos 50% mais pobres.
Essas informações foram calculadas pelo Ipea a partir da pesquisa de emprego e rendimento do IBGE para seis áreas metropolitanas e se referem apenas à renda do trabalho.
Portanto, variações da renda "per capita" e do grau de desigualdade de renda afetam a pobreza de maneira oposta. O crescimento da renda, do emprego e dos salários tem como efeito a redução da pobreza.
Por sua vez, o aumento da desigualdade tem como efeito o aumento da pobreza. Entre 1980 e 1990 (quadro 2), ambas as variáveis tiveram um desempenho que levou a substancial aumento da pobreza: a renda "per capita" declinou 0,4% e a desigualdade se elevou para 5,4%.
A aceleração da inflação na década de 80 tornou evidente o seu papel na redução da renda dos mais pobres, seja pela falta de acesso ao mercado financeiro, seja pelo fato de os reajustes salariais obtidos, a despeito da progressiva indexação, estarem sempre atrasados em relação à inflação.
Os mais ricos, por sua vez, por terem acesso à moeda indexada, são capazes de se proteger da corrosão inflacionária. Assim, a inflação, ao aumentar a desigualdade, torna-se um elemento adicional à recessão e ao desemprego, no sentido de explicar o aumento da pobreza durante a década perdida.
De fato, foi a falência dos programas de estabilização daquela década a causa principal do aprofundamento dos problemas sociais no Brasil, pois, além de aumentar a desigualdade, tornou crônicos a recessão e o desemprego.
Essa situação, ilustrada no gráfico 1, agravou-se progressivamente ao longo dos primeiros anos da década de 90: de 1990 a 1992, anos correspondentes ao governo Collor, observamos o milagre econômico dos anos 60 às avessas: perda de renda para todos os décimos da distribuição, de forma que, a despeito da melhoria na desigualdade de renda, todos perderam renda, acarretando uma nítida deterioração do nível de bem-estar social.
No período de 1992 a 1994, correspondente ao governo Itamar Franco, observamos o caráter concentrador de renda que a alta inflação é capaz de ter. Apesar do crescimento econômico, as camadas mais pobres da população experimentaram perdas absolutas de renda, enquanto as mais ricas tiveram ganhos.
Os dois últimos anos -1995 e 1996-, correspondentes ao governo Fernando Henrique Cardoso, registram, como se constata comparando com o ocorrido nas décadas de 60, 70 e 80 (quadro 1), uma fase inédita da história brasileira estatisticamente documentada: crescimento econômico com distribuição de renda; todos os extratos de renda têm ganhos, porém os maiores ganhos dão-se para as classes de mais baixa renda.
E esse resultado, diferentemente do que tem ocorrido em outros países que adotaram programas puramente monetários de estabilização, foi possível graças ao Real. A estabilização possibilitou resultados positivos, em ambas as direções, favoráveis à redução da pobreza.
Em primeiro lugar, durante estes dois anos, a renda "per capita" cresceu (4,3%) graças à retomada do crescimento econômico (7,2%), à criação de novos postos de trabalho (820 mil) e ao aumento do salário real (18%).
Em segundo lugar, a distribuição da renda melhorou graças ao fim do imposto inflacionário, que incidia sobre as classes mais pobres, à política de recuperação do valor real do salário mínimo (+8,2%, comparado com o valor médio de 1994), à redução em 40% da variabilidade temporal das rendas reais individuais e, portanto, da incerteza de renda, permitindo a ampliação significativa do mercado de crédito direto ao consumidor.

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