São Paulo, domingo, 29 de junho de 1997
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A questão externa

ÁLVARO ANTÔNIO ZINI JR.

O endividamento externo da economia brasileira está repetindo o ocorrido nos anos 70 e traz riscos de que, em um ou dois anos à frente, tenhamos um choque de ajustamento para pagar esse endividamento, semelhante ao ocorrido nos anos 80.
Os economistas do governo vêm minimizando esses riscos por desejarem manter a situação até a próxima eleição, mas esquecem-se de que a dívida que está sendo acumulada terá de ser paga.
Em sua coluna de sexta-feira, Celso Pinto expôs o raciocínio do diretor do Banco Central, Francisco Lopes, de que em quatro ou cinco anos a competitividade cambial estará recomposta. Tudo parece muito bonito se não se atentar que a deterioração das contas externas é um fato e não mera figura de linguagem.
Vejamos alguns números para mostrar que o problema é sério. A dívida externa brasileira fechou 1996 em torno de US$ 176 bilhões. Tomando-se o déficit em conta corrente, menos investimentos diretos no setor produtivo, a dívida deve crescer para cerca de US$ 200 bilhões em 1997 e chegar próximo a US$ 230 bilhões em 1998.
Paralelamente, nossas exportações estão praticamente estagnadas. Foram de US$ 48 bilhões em 1996 e não devem passar de US$ 50 bilhões em 1997. Mantendo-se essa evolução, a exportação total deve ficar em torno de US$ 51 bilhões em 1998.
Para se analisar se as contas externas de um país são sustentáveis, usam-se indicadores como a razão entre dívida externa e exportações, serviço da dívida sobre exportação e juros líquidos sobre exportações.
A relação dívida/exportação alcançará o valor de 4 em 1997, caminhando para 4,5 em 1998. O nível que se tem como seguro é que essa relação não deve ultrapassar 2.
O indicador mais sensível é a relação juros líquidos pagos sobre exportações. Fechamos 1996 com os juros líquidos absorvendo 21% do valor exportado. Essa relação deve aumentar para 24% em 1997 e ir para 27% em 1998. Ou seja, estamos caminhando para níveis perigosos de comprometimento da receita de exportações com o serviço líquido da dívida.
Infelizmente, não se pode ficar acumulando passivos externos a essa taxa de crescimento. Cedo ou tarde chega o momento de reduzir substancialmente o déficit externo e pagar parte da conta. Para tanto será necessário que a receita com exportações cresça significativamente, o que não irá ocorrer com a esperança de que aos pouquinhos se recupere a competitividade cambial.
Como o governo não parece que irá efetuar a correção necessária na taxa de câmbio, vamos chegar ao final do próximo ano com o crédito externo esticado ao limite. Aí possivelmente teremos uma correção drástica do câmbio e seu impacto nas contas públicas. O quadro fiscal, que já é precário, terá de arcar, então, com o déficit provocado pelas despesas acrescidas com os juros externos.

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