São Paulo, terça-feira, 1 de julho de 1997
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Esqueçam o que ele disse

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - No discurso de posse, o presidente Fernando Henrique Cardoso foi de uma clareza absoluta: "Falta justiça social. (...) Será este o objetivo número um do meu governo".
Belas palavras. Pena que seu ministro da Fazenda, Pedro Malan, remete-as, agora, à coleção do "esqueçam o que ele disse".
Em entrevista à Folha, publicada domingo, Malan transfere para "médio e longo prazo fazer o Brasil um país mais justo socialmente".
O que era, para o presidente, o "objetivo número um" de seu governo, vira tarefa para o futuro.
É bom lembrar que, no discurso de posse, FHC estava se referindo a um único período presidencial, porque, embora já se tramasse a reeleição, era, então, hipótese inexistente. Não dá, pois, para adotar o malabarismo verbal de supor que o "médio e longo prazo" de Malan se aplica a um eventual segundo mandato de FHC.
Tampouco vale o malabarismo, contido de resto no artigo do presidente publicado no domingo pela Folha, de afirmar que a derrubada da inflação é a maior arma para a justiça social.
Ajudou e ajuda muito, claro, mas:
1 - quando fez o discurso de posse e definiu justiça social como prioridade um, o Plano Real já estava vigorando e já havia produzido o fim do imposto inflacionário que pune os mais pobres.
O presidente reconhecia, não obstante, que faltava justiça social;
2 - se, após três anos de Real, o ministro Malan continua falando em justiça social, embora a médio e longo prazo, é porque o plano pode ter sido condição necessária, mas não é suficiente, para alcançá-la no período de governo FHC.
Não estou criticando Malan, que pode ser acusado de tudo, menos de desonestidade intelectual, até onde consigo ver.
O ponto é outro: está na hora de o Brasil parar de encarar compromissos solenes (e discurso de posse talvez seja o mais solene de todos) como mero exercício de retórica.

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