São Paulo, quinta-feira, 10 de julho de 1997
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Rumo à catástrofe. Mas com alegria

ALOYSIO BIONDI

A equipe FHC, doutor Gustavo Franco e doutor Pedro Malan à frente, disse durante anos que o rombo na balança comercial, isto é, exportações em valor insuficiente para cobrir os gastos com importações, seria temporário. Que as compras no exterior em breve voltariam a níveis normais.
Dois anos de importações crescentes e rombo comercial galopante fizeram o presidente Fernando Henrique e seus "gênios que olham para o futuro" mudar essa ladainha otimista. Só a ladainha. O otimismo, a alegria de sentir-se genial continuaram os mesmos.
A equipe do Planalto passou a dizer, sempre alegremente, que o Real não está ameaçado pela "torra de dólares" e que o Brasil não está ameaçado por nenhuma catástrofe econômica, provocada pelo violento endividamento no exterior e por despesas cada vez maiores com juros, remessas de lucros, fretes de navios, além das importações (operações que, somadas, representam a chamada balança de conta corrente).
O sempre alegre raciocínio oficial baseia seu otimismo em dois pontos principais:
Primeiro: o Brasil está atraindo capital estrangeiro a rodo. Há investimentos de multinacionais, na compra de empresas brasileiras ou novos negócios, bem como a entrada de dólares para aplicação em Bolsas ou no jogo de ganhar juros. Esses dois tipos de investimentos -diz-se- são suficientes para cobrir, reduzir, uma parte substancial do "rombo" da balança de contas correntes.
Segundo: as exportações tendem a crescer, principalmente com o (pretenso) apoio à agricultura.
As estatísticas mais recentes, do próprio governo, mostram que essas expectativas estão, mais uma vez, erradas. Ao contrário do que dizem o presidente e seus assessores, o Brasil caminha de forma cada vez mais acelerada para uma crise de "falta de dólares" para pagar seus compromissos. Como ocorreu com o México, e agora, com um dos "tigres asiáticos", a Tailândia.
Investimentos?
Malan e Franco repetem que os investimentos diretos devem chegar a US$ 12 bilhões neste ano. Acontece que há manipulação nesses dados, isto é, em alguns casos não há dólar entrando para ficar no país coisa nenhuma. Exemplo: na semana passada, divulgou-se que um empréstimo internacional concedido a um dos compradores da Vale do Rio Doce, possivelmente no valor de US$ 1,2 bilhão, foi "considerado" como "investimento", nas estatísticas do Banco Central. Ora, um "empréstimo", mesmo que seja feito para o tomador investir, continua a ser um empréstimo, isto é, aumenta a dívida e tem de ser pago. Não reduz "rombos".
Privatizações
Kandir e Loyola falam também em bilhões de dólares que seriam trazidos para o país, para a compra de estatais, dentro da política de privatização. Ora, no recente e escandaloso leilão de ações da Cemig, estatal mineira, no valor de US$ 1,1 bilhão, o grupo norte-americano "comprador" acabou recebendo financiamentos, do BNDES, no montante de 75%. Isto é, trouxe (se é que trouxe...) apenas 25%, ou pouco mais de US$ 250 milhões. Nem a privatização a toque de caixa, portanto, está servindo para cobrir o "rombo".
Especuladores
A entrada de dólares para aplicação nas Bolsas de Valores e mercado de ações do Brasil disparou em 1996 -até porque os preços das ações estavam baixíssimos e os especuladores internacionais vislumbraram a possibilidade de lucros fantásticos. Mas essa entrada (anexo 4), após atingir cerca de US$ 1 bilhão em janeiro deste ano, passou a despencar continuadamente. Chegou a apenas US$ 260 milhões em abril, e US$ 180 milhões em maio. Para junho, o desempenho foi ainda pior. Vale dizer: o investidor internacional já acendeu um "sinal amarelo" para o Brasil.
E as exportações agrícolas? Seu valor vai despencar em 1998, porque o mundo caminha para uma supersafra.
A equipe FHC e os analistas-pavões continuam a olhar o futuro. Alegremente, claro.

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