São Paulo, quarta-feira, 16 de julho de 1997
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A ilusão do primeiro round

LUÍS NASSIF

É escapista a lógica da equipe econômica, de considerar benéficos para o Brasil os movimentos que sacodem o mercado cambial dos países asiáticos.
Grosso modo, há dois leitos por onde transita o capital internacional. Um, o leito financeiro, dos investimentos que pulam de país para outro, buscando a melhor combinação entre rentabilidade e segurança. O segundo, das transações de bens e mercadorias, que dependem da competitividade e da taxa de câmbio das respectivas economias nacionais.
Embora menos volátil, o segundo fluxo -do comércio-representa o indicador mais relevante para pautar os humores do primeiro fluxo -o dos investimentos. E depende, em grande parte, das políticas cambiais.
A cada desvalorização da moeda, trabalhadores perdem renda e investidores perdem patrimônio. Por isso mesmo, a desvalorização cambial é utilizada apenas por aqueles países que não dispõem de outras alternativas para equilibrar sua balança comercial
Periodicamente, esses países deficitários promovem ajustes em sua moeda, empobrecendo-se para sobreviver; e países superavitários mantém a valorização de suas moedas, transferindo para seus habitantes as vantagens de dispor de uma economia mais competitiva.
Esses ajustes vão permitindo à economia internacional se equilibrar.
Entrada da China
O que ocorre hoje em dia é que a entrada da China no comércio internacional promoveu um aumento inesperado na oferta de bens, rompendo com o antigo equilíbrio.
Os tigres asiáticos -e não apenas eles, como o próprio Brasil, após as loucuras do segundo semestre de 1994-- passaram a enfrentar problemas com suas exportações e com a competição interna com os importados. Essa fragilidade tornou suas moedas vulneráveis a ataques especulativos.
No primeiro tempo desse jogo, é possível que os investidores se assustem com os movimentos cambiais na Ásia, e resolvam buscar o porto seguro do Brasil. Não significa grande coisa.
O que acomete as autoridades é a chamada ilusão do primeiro round, do lutador que se saiu melhor, mas gastando sua energia e esquecendo-se que há mais rounds a serem lutados.
No segundo round, o jogo começa a mudar de figura.
A desvalorização das moedas nacionais reduzirá os preços e aumentará de novo a penetração dos produtos asiáticos no mercado internacional. Se há um fluxo dado de comércio, se a China avança, e se os asiáticos recuperam espaço com as alterações cambiais, quem perde fatias do mercado?
Justamente os países que não realinharem seu câmbio ou não conseguirem compensar, via aumento de produtividade, a redução da competitividade.
Passado o desarranjo e o mal estar iniciais, em prazo relativamente curto -desde que recuperem os fundamentos macro-econômicos e não sobrevenha uma crise bancária ou política mais fortes--, as economias asiáticas se tornarão novamente atrativas aos investidores.
Ora, mesmo antes desse realinhamento cambial da Ásia, o Brasil já vem mal-e-mal sustentando um ritmo discreto de aumento das exportações de manufaturados e alguma recuperação nos primários, que não compensam o aumento registrado nas importações.
Como a economia se comportará nessa nova quadra?
Asmann e concessões
Apesar de sua seriedade e biografia, o ex-secretário dos Transportes de São Paulo, Plínio Asmann -que antes de ontem pediu demissão do cargo--, vinha se constituindo no principal empecilho para o processo de concessão das rodovias paulistas.
Em vez de proceder como seu colega da Secretaria de Energia, e se valer da experiência nacional já acumulada, preferiu montar a modelagem das concessões internamente.
Uma sucessão de erros técnicos, uma série de complexidades sem razão nos editais, falta de experiência em aspectos jurídicos, receio de definir preços mínimos, mais algumas atitudes pouco lógicas do Tribunal de Contas do Estado -cancelando uma licitação por "excesso de garantidas exigidas"- acabaram atrasando o que poderá se constituir em um ds principais trunfos do governo Covas.
Sua substituição por Michel Zeitlin -ex-diretor da FGV-SP-deverá ajudar a deslanchar o processo.

E-mail: lnassif@uol.com.br

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