São Paulo, sexta-feira, 18 de julho de 1997
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"Anjo diluidor" lança terceira flecha

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL

O cantor e compositor paraibano Chico César, 33, chega a seu terceiro disco disposto a encetar o emblema de "anjo diluidor" -"Beleza Mano" termina, apocalíptico, com a canção "Últimas Palavras do Anjo Diluidor".
"Estou trabalhando na diluição de Dominguinhos, de Arrigo Barnabé, de Lokua Kanza, de Thaíde e DJ Hum (todos participantes do CD), em sintonia com o que se faz ou desfaz neste final de milênio."
Ele continua: "Acho que a MPB vai chegar inteira ao fim do século, porque não se amesquinha num só estilo. Ela é autocorrosiva, mas é disso que vem o novo. A diluição é um valor artístico positivo".
Paraibano de Catolé do Rocha radicado em São Paulo há 12 anos, chega ao terceiro disco em curva ascendente de sucesso. "Aos Vivos" (95) vendeu cerca de 100 mil cópias ("era um projeto comercial secreto, só vendeu 9.000 cópias até sair o segundo CD); "Cuscuz Clã" (96), cerca de 200 mil.
"Beleza Mano" investe ainda na experimentação de letras concretistas, mas ao mesmo tempo aprofunda o mergulho já antes esboçado na pesquisa de ritmos de raiz.
"Um disco é como se fosse uma sessão se acupuntura, toca você em vários pontos, nos pés, nas têmporas, nos lábios. O Fagner se associou ao Hermeto Pascoal, a Wanderléa, ao Egberto Gismonti -são conceitos de sensibilidade, não de dar um no cravo e outro na ferradura", define.
"O novo é meu disco mais provocativo, em princípio não tem nenhuma 'Mama África', nenhuma 'À Primeira Vista'", diz, referindo-se aos hits anteriores. "Calar qualquer dos meus lados seria uma violência muito grande."
A faixa "Espinha Dorsal de Mim", com participações de Arrigo Barnabé, Siba (do Mestre Ambrósio), Thaíde e DJ Hum, Lulu Santos e André Abujamra, é emblemática, segundo ele.
"Tudo aquilo está dentro de mim. Há muito receio por parte dos artistas de dialogar com uma grande gravadora. É o que tento nessa faixa. 'Beleza Mano' não é mais um disco das festas do interior do Brasil, ele parte da perspectiva das periferias urbanas."
"Caegil"
Chico não nega que pretenda abrir cada vez mais mercado. "Gosto de poder entrar em contato com esse mundo 'Sétimo Céu'. Gosto de ir na Ana Maria Braga, de encontrar a Angélica, o Tiririca. Um pouco de bagaceira é bom, é bom não ficar numa redoma cult. Eu sou assim", diz.
Mas o aceno ao popular não fecha os flancos do experimentalismo. "Um verso como 'é preciso dar cu', de 'Espinha Dorsal do Mim', não vai me abonar muito perante meu pai ou as freiras do meu colégio, mas é necessário."
Diz que tentou ser mais ousado ainda. "Queria lançar neste ano 12 discos, um por mês -uma enciclopédia?" Tantos discos dariam conta dos anos e anos de composições acumuladas -que devem ocultar não poucas surpresas.
Chico tem no baú, por exemplo, uma composição chamada "Caegil", com letra de Pedro Osmar, que diz: "Caetano Veloso está velho", "Gilberto Gil está velho".
"Versa sobre a ação do tempo, até no sentido oriental. Mas quando cantava, ela criava certo constrangimento, por tocar em algo tão intocável."
Hoje, Chico é comparado a Caetano e a Gil e se orgulha de "estar filiado à principal corrente da MPB". "Mas espero um dia poder gravar essa música, quem sabe com a participação deles."

Disco: Beleza Mano
Artista: Chico César
Lançamento: MZA/PolyGram
Quanto: R$ 18, em média

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