São Paulo, terça-feira, 22 de julho de 1997
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Limites para a ação do BC

CELSO PINTO

Um aspecto pouco discutido da crise monetária asiática é o papel dos bancos centrais. A crise arrastou Tailândia, Filipinas, Malásia, ontem atacou feio a moeda da Indonésia e na sexta-feira provocou tremores na moeda de Cingapura.
Quem começou o processo foi a Tailândia. Quando houve a primeira onda mais forte de especulação contra o baht tailandês, em maio, a reação das autoridades foi imediata e dura. O banco central tailandês perdeu de US$ 3 bilhões a US$ 4 bilhões de suas reservas defendendo o baht. Vários bancos centrais da região, incluindo os da Malásia, Indonésia e Filipinas, anunciaram sua disposição em ajudar a Tailândia a defender sua moeda e intervieram nos mercados. Além disso, o banco central tailandês subiu suas taxas de juros e proibiu empréstimos em baht para bancos operando no mercado "offshore": os especuladores tomavam esses empréstimos para alavancar posições no mercado futuro apostando na desvalorização do baht. O ataque especulativo acabou contido, o banco central tailandês cantou vitória e prevaleceu a visão de que o Sudeste Asiático operava de forma orquestrada com seus bancos centrais. Quando, no entanto, veio a segunda onda especulativa contra o baht, a história foi muito diferente.
O banco central tailandês esboçou uma reação, perdeu alguns bilhões de dólares, mas acabou desistindo e deixando a moeda flutuar. Os outros bancos centrais da região, dessa vez, se omitiram.
Quando a pressão especulativa espalhou-se por outros países, a reação foi parecida. As Filipinas chegaram a gastar pouco mais de US$ 1 bilhão das reservas, mas desistiram e deixaram a moeda flutuar.
A Indonésia ampliou a banda de flutuação da rúpia para 12%, supondo que a incerteza embutida numa faixa tão ampla acabasse afastando os especuladores. Funcionou por um tempo. Ontem, contudo, a rúpia foi submetida a uma forte pressão especulativa, bateu no piso da banda cambial e seu futuro ficou incerto.
O México, em 94, arrastou quase um ano de perda sistemática de reservas e deterioração de sua posição externa antes de deixar a moeda flutuar. Por que a Tailândia não fez o mesmo? Certamente porque, a partir de certo momento, ficou claro que o custo de defender a moeda poderia ser mais alto do que os benefícios. O mesmo pode ser sugerido em relação à ação conjunta dos bancos centrais do Sudeste Asiático. Esse é um ponto importante. O fato de um banco central ter condições de aguentar durante algum tempo um ataque especulativo contra sua moeda não quer dizer que ele irá, necessariamente, fazê-lo até as últimas consequências. Existem três armas clássicas de defesa: o uso das reservas (vendendo dólares para comprar a moeda local), a elevação das taxas de juros e a imposição de controles cambiais. A Tailândia, de início, usou as três armas. O processo, contudo, é custoso. Ter um alto volume de reservas pode ser uma arma eficaz para inibir um ataque especulativo. Quando no entanto ele acontece e o quadro geral indica que a posição ficou insustentável, continuar gastando as reservas pode acabar servindo apenas para premiar os especuladores e deixar a posição do país mais vulnerável quando a desvalorização acontece. Foi o que aconteceu com o México em 94.
Elevar os juros pode ajudar, mas, se o sistema bancário está frágil, como era o caso da Tailândia, prolongar essa política vários meses pode ser suicida. A quebra de bancos pode ser pior do que a desvalorização.
Controles cambiais têm provado ser inúteis. A Espanha impôs controles cambiais duros, em 92, a Tailândia tentou o mesmo agora e ambos fracassaram. A pressão do mercado financeiro globalizado foi mais forte.
A verdade, contudo, é que os ataques especulativos só chegam a situações-limite como essas quando o país atacado tem claras fragilidades em sua política macroeconômica. O que dá fôlego ao mercado é a convicção que a situação é insustentável. A melhor lição das várias crises monetárias, portanto, é simples: para evitá-las, basta fazer direito a lição de casa da economia.

E-mail: CelPinto@uol.com.br

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