São Paulo, segunda-feira, 28 de julho de 1997
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Governo não controla acordos com usineiros

ELVIRA LOBATO
DA ENVIADA ESPECIAL A MACEIÓ

Na edição do "Diário Oficial" de Alagoas do último dia 13 de junho, o governo reconheceu publicamente o que já se desconfiava: até o final do ano passado, o Estado não exerceu nenhum controle sobre os acordos para devolução de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) aos usineiros, assinados em 1988 e 89 pelo então governador Fernando Collor de Mello.
Os valores já embolsados pelos usineiros, em função dos acordos, só foram conhecidos em setembro de 96, quando uma comissão especial nomeada pelo governo teve acesso à contabilidade das usinas.
O resultado da apuração -publicado no "Diário Oficial"- mostra que os usineiros ainda teriam um saldo a abater de R$ 248,69 milhões, se o valor original dos acordos fosse corrigido pelo IGP (Índice Geral de Preços).
A Secretaria da Fazenda não concorda com o resultado e sustenta que os usineiros já embolsaram R$ 289 milhões a mais do que deveriam. Segundo a Fazenda, as usinas e suas coligadas deixaram de recolher cerca de R$ 600 milhões de ICMS nesses nove anos.
O governador interino, Manoel Gomes de Barros, suspendeu os contratos com as 30 usinas e destilarias assinados por Collor.
Ele disse que não negocia a devolução dos créditos remanescentes apontados pela comissão: "Não aceito devolver nada", afirmou.
Medida "cinematográfica"
Para o presidente do Sindicato da Indústria do Açúcar e do Álcool, Jorge Toledo, que até 96 foi secretário de Planejamento de Suruagy (Barros era o vice), o rompimento dos contratos foi uma medida "cinematográfica".
Segundo ele, os usineiros não tomarão nenhuma atitude: "Vamos aguardar os acontecimentos".
Em julho de 87, Collor assinou um primeiro acordo com 19 usinas (uma fechou) para devolução, em dez anos, do ICMS recolhido nos cinco anos anteriores sobre a cana própria (plantada nas terras das usinas) destinada ao açúcar de exportação. Esse acordo envolveu o equivalente a US$ 78,7 milhões.
Em maio de 88, um dia antes de deixar o cargo para disputar a Presidência, Collor aprovou outro acordo, com mais 11 usinas, envolvendo US$ 41 milhões.
O STF (Supremo Tribunal Federal) havia declarado indevido o recolhimento de ICMS sobre a cana plantada nas terras das usinas, quando usada para fabricação de açúcar para exportação.
Collor desconsiderou o fato de que a exportação era monopólio do IAA (Instituto do Açúcar e do Álcool) e que o instituto já havia devolvido o imposto aos usineiros. Alagoas foi o único Estado a assinar esse tipo de acordo.
O primeiro acordo corrigia o valor mensalmente pelo IGP ou IGPA (Índice Geral de Preços por Atacado) da Fundação Getúlio Vargas, prevalecendo o maior.
O segundo admitia o reajuste mensal "pelo maior índice de correção de moeda" de âmbito nacional existente no país. Resultado: desde maio de 89, as signatárias do segundo acordo usaram 22 diferentes índices de correção, incluindo até o INCC (Índice Nacional da Construção Civil).
Ao analisar as planilhas dessas empresas, os fiscais constataram que, a persistir tal sistema, as 11 empresas do segundo acordo teriam um crédito de R$ 1,5 bilhão.
Erros grosseiros
O procurador-chefe da Fazenda Nacional em Alagoas, Aldemário Castro, fez um relatório apontando erros grosseiros nos acordos, que poderiam ter sido usados para anular os contratos.
Castro disse que Collor não submeteu os acordos à Assembléia e que qualquer ato administrativo que implique perda de receita é nulo se não for aprovado por lei.
Segundo ele, os acordos não saíram no "Diário Oficial", o que também os tornaria nulos. Por fim, o acordo de 89 nunca foi homologado pela Justiça, o que desobriga o governo de cumpri-lo.
O Estado, no entanto, perdeu todos os prazos para contestação. O procurador Evilásio Feitosa, designado pelo governador interino para entrar com ação para anular os acordos, disse que vai usar a crise financeira como argumento.
Campanha
Em 89, o promotor Luciano Chagas denunciou, na 8ª Vara de Justiça do Estado, que os usineiros teriam contribuído para a campanha de Collor com 20% dos valores negociados no acordo.
O promotor disse que soube da informação por outro advogado que esteve nos encontros dos usineiros com Paulo César Farias.
Em maio do mesmo ano, Barros, então secretário da Assembléia, denunciou o acordo e o pagamento de US$ 7 milhões em comissões.
Na semana passada, já como governador interino, ele confirmou ter discursado contra o acordo, mas disse não se lembrar do detalhe da comissão.
(EL)

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