São Paulo, terça-feira, 29 de julho de 1997
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Clinton faz "blitz" para ter mãos livres

CLÓVIS ROSSI
DO CONSELHO EDITORIAL

O governo norte-americano iniciou uma ofensiva para convencer o Congresso a lhe conceder o mecanismo chamado de "fast track", que lhe dá relativa liberdade para negociar acordos comerciais.
O alvo é a negociação com os demais 33 países americanos para constituir, até 2005, a Alca (Área de Livre Comércio das Américas), que exclui apenas Cuba.
O "fast track" (via rápida, literalmente) é um instrumento que permite ao Executivo negociar acordos comerciais para que, depois, o Congresso os aprove ou rejeite em bloco, sem poder introduzir emendas.
Esforço
Bill Clinton designou o empresário Jason Berman para comandar o esforço de convencimento do Congresso.
Berman é o diretor-presidente da consultoria "Recording Association of America" e trabalhará ao lado de uma das assessoras da Casa Branca, Victoria Radd.
As designações ocorrem antes mesmo de o presidente Bill Clinton enviar ao Congresso o pedido formal para a concessão do "fast track", o que só ocorrerá em setembro.
Sem o "fast track", os eventuais parceiros dos Estados Unidos acham inútil qualquer negociação. Temem chegar a um acordo com o Executivo apenas para que ele seja, depois, fatiado pelo Congresso por meio de emendas.
O Brasil, por exemplo, condiciona qualquer avanço nas negociações para a Alca à obtenção da "via rápida" pelo Executivo norte-americano.
Para valer
Até o governo norte-americano admite que, sem o "fast track", não há negociação para valer.
"Sem ele, nossos negociadores se transformam em observadores gloriosos neste processo negociador e nós cedemos a iniciativa a outros países", disse, na semana passada, Jeffrey Davidow, subsecretário de Estado, em depoimento ao Congresso.
Acrescentou Davidow: "Os Estados Unidos podem liderar a Alca apenas se seus funcionários tiverem a autoridade do 'fast track"'.
Por isso mesmo, a retomada hoje, na Costa Rica, dos entendimentos em torno da Alca será apenas uma formalidade.
Só na próxima reunião de vice-ministros, marcada para outubro (depois, portanto, de solicitado o "fast track") é que os demais países americanos saberão mais claramente o teor da negociação para a Alca.
Salmão no caminho
A obtenção do "fast track" não dilui todos os problemas na negociação da Alca.
Um exemplo muito eloquente vem do Chile, país que já deveria estar incorporado ao Nafta, a zona de livre comércio formada entre os Estados Unidos, o Canadá e o México.
Mas, exatamente pela falta do "fast track", não foi incluído e, agora, entra em conflito com os Estados Unidos por culpa do salmão.
O Chile vende cerca de US$ 180 milhões por ano de salmão para os Estados Unidos, mas o governo norte-americano abriu processo contra as exportações desse pescado, alegando a prática de dumping (vender um bem a preço de custo ou até inferior, para conquistar deslealmente um mercado).
O governo chileno ameaça levar o caso à OMC (Organização Mundial do Comércio), que zela pelo cumprimento de regras internacionais.
A guerra do salmão já produziu cerca de 400 baixas no Sul do Chile, na forma de dispensas de trabalhadores do setor.
O Chile foi o primeiro (e único, até agora) país americano a ser convidado a fazer parte do Nafta logo no lançamento das negociações da Alca (na Cúpula das Américas, Miami, dezembro de 1994).
O projeto do governo norte-americano, contestado pelo Brasil, é construir a Alca por meio da incorporação ao Nafta de cada um dos demais países americanos.
Se há esse tipo de divergências com o primeiro que deveria ter sido incorporado, é fácil imaginar o tamanho das dificuldades para fechar o pacote todo da Alca.

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