São Paulo, terça-feira, 29 de julho de 1997
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PSDB: recuperar as raízes

ODED GRAJEW

O jornalista Clóvis Rossi comunica na sua coluna da Folha (11/7) "o falecimento do PSDB, vítima dos mesmos indecentes métodos de fazer política que fizeram seus fundadores se afastarem do PMDB e criarem o Partido da Social Democracia Brasileira".
Aproveito a oportunidade para relembrar fatos históricos que ocorreram em 1993, dos quais talvez poucas pessoas se lembrem e outras nem sequer saibam. Esses acontecimentos trazem informações sobre a doença fatal que vitimou o partido. Quem sabe possam ajudar a viabilizar sua futura ressurreição.
No ano anterior às eleições gerais de 1994, um grupo de integrantes do PT e do PSDB se reuniu e elaborou um manifesto intitulado "Conclamação". Após descrever o estado de decomposição social e ética do país, o manifesto declara:
"Precisamos eleger governantes e representantes parlamentares que estejam comprometidos com um programa de garantia de direitos sociais, de geração de novos empregos e, consequentemente, de crescimento com maior justiça na distribuição da renda e no combate à corrupção, à sonegação e ao desperdício do setor público, colocando o Estado a serviço do bem comum. Para viabilizar esse programa, impõe-se claramente a necessidade de aproximação entre os partidos e grupos realmente comprometidos com as reformas éticas e sociais, entre eles, especialmente, o PT, o PSDB e alas progressistas do PMDB, que, apesar de algumas diferenças de origem, de atuação e de concepção sobre instrumentos necessários para atingir, na maioria das vezes, os mesmos objetivos, crescem hoje em respeito e credibilidade aos olhos da sociedade".
O manifesto conclamava esses partidos a se aproximarem e a formarem uma aliança progressista. Em dez dias, o manifesto foi subscrito por aproximadamente 500 pessoas (políticos, empresários, sindicalistas, profissionais liberais, intelectuais e artistas, todos muito representativos). Alguns deles estão hoje nos principais escalões do governo federal.
O manifesto foi entregue em dezembro de 1993, num evento público, a Lula, presidente do PT, e a Tasso Jereissati, presidente do PSDB, que deram sinal verde para o prosseguimento dos entendimentos. Um grupo de trabalho foi constituído, formado por representantes do PT e do PSDB, e começou a elaborar um programa comum.
Os trabalhos, que iam muito bem, foram interrompidos pelo anúncio da aliança entre o PSDB e o PFL e pelo lançamento da candidatura FHC. Foi uma enorme decepção para todos.
Naquela altura dos acontecimentos, imaginar que o PSDB de FHC faria uma aliança com o PFL de ACM e o PPB de Maluf seria considerado fruto da imaginação doentia de algum alucinado. Essa aliança viabilizou a permanência no poder do mesmo grupo oligárquico que apoiou a ditadura militar e levou o Brasil a ser o campeão mundial da desigualdade social.
O resto da história todos conhecem. Os minimamente bem informados conhecem mais ainda, sem a desculpa da ignorância que infelizmente ainda atinge uma enorme parcela da população brasileira, manipulada por demagogos e exploradores da miséria, da insegurança e da boa-fé.
Os aliados contagiaram o PSDB com suas velhas e viciadas práticas políticas e levaram ao seu falecimento ético e moral, anunciado por Clóvis Rossi. E o exemplo dos que estão no poder acaba se refletindo nos valores da população.
Não é por acaso que a opinião pública hoje acredita, na sua maioria, que o certo é se locupletar com a bandalheira, conforme atesta o programa "Você Decide", da Rede Globo, do dia 10/7.
Os formadores de opinião conseguiram formar uma opinião pública absolutamente descrente das virtudes da cidadania e da decência.
Como brasileiro, petista, amigo, companheiro e admirador de muitos integrantes do PSDB, torço sinceramente e com a maior das esperanças pela refundação de um partido social-democrata autêntico, fiel, na prática, ao seu ideário, impregnado de compromissos éticos e sociais e que possa dar uma importante contribuição para que o Brasil saia do atoleiro da miséria e da imoralidade.
O nosso país só terá um futuro mais digno no momento em que tiver setores sociais e alguns partidos políticos fortes e autenticamente progressistas. Foi assim que chegamos às eleições diretas e ao impeachment do Collor. Só assim poderemos recuperar a confiança do povo na ética e na democracia.

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