São Paulo, sexta-feira, 1 de agosto de 1997
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Serra, Franco e o futuro

CELSO PINTO

Erra quem supõe que a indicação de Gustavo Franco para presidente do Banco Central automaticamente inibirá um retorno futuro do senador José Serra para o ministério de Fernando Henrique Cardoso, se for convidado. Essa pelo menos é a impressão de interlocutores do senador, que está no Chile, nos últimos dias.
São notórias as divergências entre Serra e Franco. A curto prazo, no entanto, ambos concordam que o que importa é preservar a política econômica.
Mais do que isso, há alguns meses começou uma discussão importante sobre o futuro, envolvendo algumas pessoas próximos ao presidente, dentro e fora do governo. Entre elas está o senador Serra.
Existe uma sugestão que tem agradado ao presidente, dizem pessoas próximas a ele. É a idéia de formar um ministério mais "técnico" no início do próximo ano, que trabalharia em torno de alguns projetos de reformas que serviriam como sinalizadores do que poderia ser um segundo mandato de FHC.
A mudança, que alguns vêem com ceticismo, seria possível pelo afastamento, em dezembro, dos vários ministros que disputarão cargos eletivos no próximo ano. Além disso, o presidente ouviu sugestões para reestruturar algumas áreas de governo. Criando, por exemplo, um ministério que reunisse vários órgãos envolvidos na política de comércio exterior do país.
Serra nunca teve planos de voltar imediatamente ao governo. Há meses, contudo, indicou sua disposição de eventualmente juntar-se a um ministério renovado em janeiro, se vier a ser convidado. A nomeação de Franco não teria mudado sua disposição.
O presidente sempre caracterizou seu governo pela convivência entre contrários. Os "desenvolvimentistas" coabitaram com os "liberais" desde o início, com FHC funcionando como árbitro. O ruído, com frequência, foi alto, mas o formato acabou deixando ao presidente o papel de condutor em última instância da economia.
A interpretação de membros da ala "liberal" é que o presidente convenceu-se, mais do que nunca, de que precisa do Banco Central como um "Bundesbank tecnocrático", numa referência ao duríssimo e ortodoxo banco central alemão.
Por duas razões. Primeiro, porque banco central é para isto mesmo: ser, antes de tudo, o guardião incansável da moeda. Depois, porque a aposta embutida na política econômica pressupõe direção firme na área de juros e de câmbio para acalmar expectativas e enfrentar eventuais turbulências.
FHC nunca duvidou um segundo de que foi eleito presidente pela inflação baixa e que poderá ser reeleito pela inflação baixa. No entanto, ele sabe que não basta a estabilidade e que, no seu próprio partido, existem fortes demandas por mais bandeiras. Fiel ao espírito de seu governo, não seria surpresa se, depois da nomeação de Franco, o próximo gesto político fosse uma sinalização simpática à ala "desenvolvimentista".
Para a história
Registre-se para a história: a decisão sobre quem seria o novo presidente do BC foi tomada na semana passada e confirmada segunda-feira.
O ministro da Fazenda, Pedro Malan, gosta muito de Franco e bancou a indicação. No entanto, antes de chegar a ele, tanto Malan quanto o presidente namoraram pelos menos dois nomes fora do governo, mas próximos à equipe econômica. Chegou a haver uma sondagem genérica.
Uma solução desse tipo traria duas vantagens. Agregaria sangue novo a uma equipe notoriamente pequena para tanta tarefa complicada. Além disso, evitaria mexer na sensibilidade do diretor Francisco Lopes, outro candidato óbvio ao posto. As alternativas de fora não vingaram, Franco foi indicado e seu nome absorvido por Lopes.
Dois nomes saíram fortalecidos do episódio, Franco e Malan. Curiosamente, contudo, ambos, em conversas diferentes com amigos, disseram ter dúvidas, por razões pessoais, se gostariam de continuar no governo num eventual segundo tucanato. Malan sempre viu com simpatia o posto de representante do Brasil junto ao FMI, embora amigos digam que ele adoraria ser ministro das Relações Exteriores.
Considerando o fato de que, da equipe original, já deixaram voluntariamente o poder André Lara Resende, Pérsio Arida e Edmar Bacha, tudo é possível. Mas só vendo para crer.

E-mail: CelPinto@oul.com.br

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