São Paulo, sexta-feira, 1 de agosto de 1997
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O futebol precisa de uma lei universal

RAI SOUZA VIEIRA DE OLIVEIRA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Greve sempre é uma atitude extrema, a última coisa a se fazer. É preciso, antes, negociar, mostrar os prós e os contras, para tentar chegar a uma decisão consciente.
Agora, quando se chega a outro extremo, como foi o caso da Argentina, nesta semana, é diferente. Não foi um jogador, nem dois, mas seis, que um clube está impedindo de trabalhar, de ganhar o pão. Eles estão certos. Só posso aplaudir o sindicato e os jogadores.
Um sindicato não existe sem o apoio dos jogadores. É necessário cumplicidade. E, nesse episódio da Argentina, isso existe e precisa ser elogiado.
Na Europa, a lei do passe acabou por um caso semelhante -um jogador que queria sair e o clube impediu. Ele entrou na Justiça e acabou ganhando. Isso deve ocorrer em todos os lugares, inclusive no Brasil, onde já houve um julgamento parecido.
A tendência é o passe acabar, e por força de movimentos desse tipo. É preciso deixar claro que a lei do passe pode impedir o jogador de fazer o seu trabalho. O profissional de futebol tem que ter liberdade, como ocorre normalmente com outros profissionais.
No Brasil, já foram dados os primeiros passos nesse sentido. Primeiro foi o Zico, quando era secretário de Esportes, e, agora, o Pelé, que está se empenhando nas negociações.
Mas mudanças, protestos, esbarram em uma questão cultural do nosso país. Em qualquer setor da sociedade, o brasileiro tem dificuldade em se organizar, protestar, em ir contra uma idéia de maneira consciente, organizada.
Demoramos para nos engajar nas lutas em favor de nossos direitos. Até pela nossa maneira de ser, mais tranquila, mais de paz. É uma questão cultural, e o futebol, obviamente, não escapa disso. De qualquer modo, mesmo que demorem, essas mudanças fazem parte, na minha opinião, de um processo irreversível.
No futebol e em tudo mais, existem cada vez menos fronteiras. A gente não pode mais viver aqui na Europa de uma maneira, e no resto do mundo, de outra, com outras leis.
Existem muitas transferências de jogadores latino-americanos para cá. Tem uma circulação muito grande entre os países. Na União Européia, não existem mais estrangeiros. Isso abre oportunidades de trabalho para os jogadores fora de suas comunidades.
Uma forte tendência, que exige uma lei universal.
Como já disse, no Brasil talvez demore um pouco mais. No começo pode até dar confusão, mas o mercado vai acabar se adaptando com a abolição da lei do passe. A própria legislação terá que ser modificada, pois tais mudanças alteram as estruturas do futebol.
Mas o princípio de liberdade tem que ser respeitado. Tem que começar por aí, por uma ideologia, e esperar que ela provoque modificações.
A greve argentina é basicamente isso e, caso eles consigam resultados práticos, a idéia pode se estender a outros países da América Latina.
No mesmo sentido, na Europa, estamos tentando organizar a Associação Internacional de jogadores. Também um processo difícil, lento, mas necessário para nos fazer representar internacionalmente.

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