São Paulo, terça-feira, 5 de agosto de 1997
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Furo mais em cima

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Muita gente fica escandalizada com a tensão entre judeus e palestinos. Não faltam aqueles que acham uma perda de tempo por parte de Israel: com a superioridade militar que possui, por que não acaba com a resistência palestina, impondo de uma vez por todas a lei do mais forte?
O atentado da semana passada mostrou que o processo de paz é um acordo de guerra. Judeus continuam construindo vilas em lugares que irritam os palestinos e esses têm sempre a justificativa da guerra santa para rechear fanáticos com explosivos que matam dezenas de judeus. Os dois rapazes que causaram a tragédia a esta hora estão gozando as delícias do paraíso de Alá.
O chão é um só e continua difícil a existência de duas nações no mesmo espaço. Os incidentes tão cedo não acabarão. Pelo contrário: tendem a se agravar.
Pulando do Oriente Médio para o Brasil. Temos um único chão para abrigar excluídos e incluídos. Algumas fotos dos últimos dias, com um coronel da polícia cearense inundado de sangue, confrontos de rua em diversas capitais, poderiam ser editadas no caderno internacional, como cenas de Jerusalém ou Gaza.
No caso de Israel e Palestina, são árabes e judeus que independem da política para deixarem de ser judeus ou árabes. Nasceram assim e assim morrerão. No caso do Brasil, a combustão é apenas econômica. São prioridades neoliberais que estreitam o direito ao trabalho, à saúde e à educação.
Na prática, o drama é parecido: um só país para duas nações.
Acreditou-se, durante muito tempo, que o bicho-papão da União Soviética alimentava esse tipo de briga de dois povos brigando pelo mesmo espaço.
O furo é mais em cima. Judeus e árabes terão de chegar a uma paz difícil para as duas partes. Excluídos e incluídos jamais chegarão a um acordo. A menos que os mais fortes resolvam adotar alguma coisa parecida com a solução final dos nazistas.

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