São Paulo, domingo, 10 de agosto de 1997
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As reformas para o futuro

CELSO PINTO

O presidente Fernando Henrique Cardoso quer fazer direito a lição de casa desta vez. Vai começar a trabalhar, já neste ano, num conjunto de propostas de reformas que poderiam dar novo alento ao Plano Real e à sua candidatura presidencial em 98.
O homem chave para isso será o economista André Lara Resende, um dos pais do Plano Real na fase de laboratório, mas que preferiu sair do governo antes do projeto ir para a rua. André assume, em setembro, o cargo de assessor direto do presidente para trabalhar num conjunto de idéias, com o inteiro apoio do ministro da Fazenda, Pedro Malan.
Há cerca de dois meses André foi convidado pelo presidente para a tarefa e tem discutido com ele, desde então, as idéias gerais. O trabalho deverá envolver pelo menos quatro áreas cruciais: fiscal, previdenciária, mercado de trabalho e financeira.
O objetivo é elaborar sugestões de mudanças. As quatro áreas são essenciais para garantir a solidez do plano econômico a médio prazo. Apesar da reforma da Previdência que está tramitando e dos esforços na área fiscal, os resultados são considerados insatisfatórios pelo próprio governo.
Existe também uma sensação, no mercado financeiro, de que o governo Fernando Henrique fez o caminho clássico das reformas liberais pela metade e que talvez esteja perdendo seu ímpeto reformista. Essa percepção é especialmente perigosa quando o país acumula déficits externos crescentes e terá uma eleição presidencial em 98. Sinalizar flexibilidade no câmbio e redobrada disposição por reformas certamente ajuda a acalmar expectativas.
Dez entre dez economistas concordam que é importante montar um sistema decente de previdência privada. Não só como alternativa ao sistema atual, mas como alavanca para a poupança interna, crucial para substituir a poupança externa a médio prazo.
O potencial é enorme. O patrimônio dos fundos de pensão equivalem hoje a 11% do PIB. Nos Estados Unidos, ele chega a 60% do PIB; no Japão, a 72%; no Reino Unido, a 80%; e na Holanda, a 120%.
Na área do trabalho, existem projetos em andamento, mas pouco foi feito. No final do ano passado, o presidente colocava a reforma do mercado de trabalho como uma das prioridades para este ano. Na prática, não conseguiu nem sequer, até agora, aprovar as reformas administrativa e previdenciária.
André está liquidando sua participação acionária no Banco Matrix, depois de já ter reduzido sua posição em dezembro último. Vai continuar em São Paulo, indo a Brasília regularmente, e vai contar com colaboradores tanto dentro quanto fora do governo.
Uma das razões para começar desde já a trabalhar nas novas idéias é evitar a repetição do fiasco do início do governo FHC. Embora tenha sido eleito com uma plataforma de reformas, FHC tomou posse, em janeiro de 95, sem um único projeto elaborado para as principais reformas (fiscal, previdenciária e administrativa).
A posteriori, o presidente tem explicado o fato de ter iniciado as reformas com as mudanças nos monopólios como uma arguta estratégia política. Na vida real, mesmo que quisesse, não teria conseguido apresentar ao Congresso as principais reformas nos seus primeiros meses do governo, porque elas não existiam.
Em parte, porque havia escassez de cérebros e excesso de tarefas importantes. Em parte, porque alguns dos mais importantes assessores, como Pedro Malan, Pérsio Arida e Edmar Bacha, levaram algum tempo, depois da eleição, em outubro de 94, até decidirem continuar no governo. O fato é que até hoje o presidente lamenta não ter iniciado seu governo com o dever de casa feito.
Não há surpresa no roteiro de temas escolhidos. Todos são passos lógicos para complementar a reforma da economia, no sentido de torná-la mais aberta e competitiva. Pode ser mais um sinal, depois da escolha de Gustavo Franco para presidir o BC, de que o presidente resolveu aproximar-se ainda mais do núcleo de economistas originários da PUC do Rio que ajudou-o a fazer o Plano Real.
A sinalização faz sentido econômico, mas gera pouca emoção eleitoral. Conhecendo o entusiasmo do presidente pela idéia de turbinar alguns programas sociais, talvez uma boa aposta adicional esteja nesta área.

E-maill: CelPinto@uol.com.br

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