São Paulo, domingo, 10 de agosto de 1997
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O sonho e o pesadelo

CLÓVIS ROSSI

Paris - Pelo pouco que tenho visto, via Internet, a mídia brasileira está dando reduzida ou nenhuma importância à greve do pessoal da UPS (United Parcel Service), uma das maiores companhias do mundo em entregas de mercadorias, cartas etc.
Pois deveria. A greve funciona como uma aula a respeito de como é falaciosa a propaganda norte-americana a respeito da situação de pleno emprego em que se encontra a maior economia do planeta.
Basta dizer que o slogan central da greve é "salvar o sonho americano". Por quê? Porque o suposto pleno emprego se deve a uma maciça tática de contratações temporárias ou part-time, com a consequente degradação salarial.
No caso da UPS, o pessoal que trabalha meio período ganha, por hora, US$ 8 ou US$ 9.
Já quem trabalha full time recebe US$ 19,95 pela mesma hora, mais do que o dobro portanto.
Quando os grevistas falam em "salvar o sonho americano" estão querendo dizer que, com esse nível salarial, a turma do part-time jamais vai poder subir na vida, rompendo o melhor da tradição norte-americana que é a ampla oportunidade de ascensão social.
Não é à toa que a brecha entre ricos e pobres, nos Estados Unidos, ampliou-se a um nível que só não se compara ao do Brasil porque o Brasil é um caso de obscenidade universal nessa matéria.
O diabo é que há inúmeros acadêmicos brasileiros e não poucas autoridades governamentais que continuam naquela de que "o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil".
E usam o pleno emprego atual como suposta prova de que é preciso copiá-los também nessa matéria. Claro que só não falam em copiar os salários, que, mesmo para os de período parcial, são, por lá, muito superiores à média tupiniquim.
Antes de imitar o sonho americano, o Brasil precisa é sair do pesadelo que é a sua absurda distribuição de renda.

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