São Paulo, domingo, 10 de agosto de 1997
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Quem avisa amigo é

ELIANE CANTANHÊDE

Brasília - Depois de viajar pelo país, o presidente do Incra, Milton Seligman, constatou o que todos estão se recusando a ver: se o MST radicaliza de um lado, os ruralistas começam a radicalizar do outro.
"É a velha lei da física: a cada ação corresponde uma reação", diz ele.
A diferença é que a "ação" costuma usar panelas, facões e espingardas enferrujadas. Já a "reação" tem meios para se armar até os dentes.
Um exemplo é o fazendeiro preso em Imperatriz (MA) depois de dar tiros contra a sede do Incra. Em seu carro, a polícia encontrou um grande e variado arsenal de armas de fogo.
Outra diferença é que o MST recorre ao marketing para tentar angariar a simpatia da classe média urbana. Os ruralistas se organizam em silêncio.
"Nós estamos muito preocupados", disse Seligman, destacando o ressurgimento da UDR em São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraná e Pernambuco, pelo menos. Se estourar uma crise num deles, vai ser apenas o estopim.
O presidente do Incra avisa ao MST que o problema da reforma agrária não é de falta de terra e que o governo fica de mãos amarradas diante da invasão de propriedades produtivas. "Elas são insuscetíveis de desapropriação. O que podemos fazer? Nada", diz. Ou seja, tudo pode acontecer.
Ninguém percebeu com antecedência a gravidade do movimento dos policiais civis e militares, até que eles trocaram tiros nas ruas de capitais.
Pode estar se repetindo o mesmo no campo, onde a vigilância é muito mais frouxa e difusa. Inclusive a exercida pela imprensa.
O atraso secular na reforma agrária é o ingrediente básico. O clima pré-eleitoral tempera, a radicalização apimenta, e a situação pode azedar.
A advertência se destina também ao próprio governo, mas principalmente ao MST, à igreja que defende invasões de terras produtivas e aos ruralistas que preferem balas a palavras.
Torçamos para que Seligman seja paranóico e que seu temor nada tenha de premonitório. De qualquer forma, fica aqui sua pergunta: "De quem vai ser a responsabilidade se houver outro massacre?"

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