São Paulo, terça-feira, 12 de agosto de 1997
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O adeus, na hora certa

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - Betinho morreu na hora certa. Campeão da solidariedade e do empenho social, morre quando uma e outro estão também feridos de morte, no mundo todo.
A hora é do individualismo exacerbado e da preocupação apenas com os ativos financeiros.
Deve ser mais do que coincidência o fato de o presidente Fernando Henrique Cardoso, que dizia ter idênticas inquietações, ter sabido da morte de Betinho quando jantava com empresários. Depois, um deles, Eugênio Staub, contava à Folha que "não há conflito" (entre o governo e o empresariado).
Que bom que não haja. Pena que não dê para dizer o mesmo das relações entre o governo e o movimento social, crescentemente criminalizado por FHC e seus áulicos.
Tampouco deve ser apenas coincidência o fato de Betinho ter morrido dias depois de o presidente do Banco Central, Gustavo Franco, ter passado direto por um garoto sujo que pedia esmola. E ter dito algo como "criança abandonada não é problema do BC".
Não é mesmo. É apenas problema de qualquer ser humano, pertença ou não ao BC.
Quando deixa de ser, não há mais lugar para os "betinhos". Passam a ser figuras ainda mais estranhas, ainda mais quixotescas, ainda mais deslocadas.
Agridem ainda mais o ambiente "clean", asséptico, em que flutuam as personalidades oficiais.
Betinho fez parte de uma geração que foi para o exílio, no início ou meados de 1964, certa de que voltaria para passar o Natal em casa. A maioria passou 15 natais no exílio, interno às vezes, externo outras tantas.
O Brasil de hoje é melhor do que aquele em quase todos os ângulos. Mas piorou sob um ponto de vista: agora, não dá mais para esperar a "volta do irmão do Henfil". Ele já voltara, fisicamente, mas a cultura hegemônica remetera seu idealismo para o exílio definitivo.

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