São Paulo, quarta-feira, 13 de agosto de 1997
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Viva Lady Di

ELIO GASPARI

Ver princesa é padecer num paraíso. Desvendando seu namoro com o milionário egípcio Dodi al Fayed, a princesa Diana de Windsor, ex-Spencer, adquiriu um leve cheiro de queimado. O namorado é uma coleção de impropriedades: plebeu, estrangeiro e árabe.
Que ela tenha namorado um cavalariço, tudo bem. Afinal, era oficial do Exército de Sua Majestade. Que seu ex-marido converse com plantas, nada de errado, já que é um príncipe. Um sogro chato, um pai que a levou ao altar chapado como um boêmio em fim de festa ou um irmão cujo apelido é "Champagne" também eram coisas toleráveis. Namorado egípcio é demais.
Lady Di está sendo crucificada no mesmo lenho onde se pendurou Jacqueline Kennedy no final dos anos 60. A princesinha viúva surpreendeu o mundo casando-se com o milionário grego Aristóteles Onassis, baixinho, interesseiro, feio como a necessidade.
Quis o destino que Jacqueline desse a volta por cima e que a história de seu casamento ficasse mais ou menos entendida. Ela casou com Onassis por dinheiro, mas ele abria a porta do carro, mandava flores (e pulseiras). Era um cafajeste, mas sabia se comportar. Ele queria prestígio, e ela, independência financeira.
Passaram-se quase 30 anos e está visto que Jacqueline conseguiu o que queria: educou seus filhos fora do circuito de "grã-finagem" e dissimulada vulgaridade do clã dos Kennedy.
Seu filho John, nascido dentro de uma receita pronta para produzir um desequilibrado, acaba de condenar publicamente o comportamento dos primos (filhos de seu tio Robert). Um parece ter namorado a babá adolescente. O outro, julgando-se Deus, teve uma crise de onipotência e pretendeu anular na Santa Sé um casamento de 16 anos e dois filhos gêmeos. Tomou pela frente uma ex-mulher leoa (Sheila Rauch, irmã de um ex-correspondente da revista "Time" no Brasil) e acabou pedindo desculpas ao público.
Jacqueline foi a única Kennedy a educar todos os seus filhos direito. Ela casou com Onassis para ser o que ela queria. Lady Di está namorando um milionário egípcio para ser ela mesma. Nos dois casos, o dinheiro conta. Estranhamente, só conta contra a mulher.
Ela foi escolhida para casar com Charles porque era virgem, e isso foi considerado uma coisa natural. Agora, quando ela resolve namorar mamamama porque, entre outras coisas, ele é rico, o mundo cai. A mulher que olha para a fortuna do namorado é impura, mas o marmanjo que só consegue um olhar de mulher bonita porque é rico tende a ser visto como um bem-sucedido.
A casa real inglesa gosta de cultivar tradições, mas não consegue conviver com o próprio cotidiano. Não há nela uma só geração sem encrenca, mas finge-se que elas não existem, destruindo os desafortunados que pretendem ter uma personalidade.
O Rei Eduardo 8º quis viver com uma americana divorciada e pagou com o exílio. Sua sobrinha Margaret (irmã da Rainha) apaixonou-se por um herói de guerra divorciado e se viu condenada a uma vida infeliz. Cada um a sua maneira aceitou o estigma por conta da preservação do prestígio e da mordomia.
Namorando um milionário, Lady Di chutou o pau da barraca. Quebrou o muro de estimas das mulheres de Windsor (cavalos, cachorros e homens, nessa ordem) e foi à luta, protegendo-se contra o risco de ficar com US$ 20 milhões a menos no cheque especial.
Pode-se fazer de conta que não se percebe a repetição do estratagema bem-sucedido de Jacqueline Kennedy, mas vale a pena torcer para que dê certo de novo. Ele permitiu que uma grande mulher continuasse sendo uma grande mulher, do jeito que ela queria.

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