São Paulo, quarta-feira, 13 de agosto de 1997
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Estado deve gerir e controlar saúde, diz especialista

AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Estados que abrem mão do financiamento da saúde acabam perdendo o controle sobre a gestão do sistema e aumentando as desigualdades no acesso aos serviços.
A afirmação é de André-Pierre Contandriopoulos, da Universidade de Montreal, Canadá, especialista em gestões de saúde e planejamento de recursos humanos.
Contandriopoulos está em São Paulo a convite da Fundap e participa de um seminário amanhã e quinta-feira, reunindo diretores regionais de saúde e secretários municipais da saúde das 60 maiores cidades do Estado.
Em entrevista ontem, o médico lembrou que em todos os países desenvolvidos -com exceção dos EUA- a saúde é financiada em mais de 70% pelo Estado.
A responsabilidade pelo financiamento não quer dizer que o Estado deva produzir saúde, construindo hospitais e atendendo doentes. "A função do Estado é gerir e controlar as atividades nessa área", afirma.
Contandriopoulos diz que todo sistema de saúde deve garantir a equidade -o acesso de todos aos serviços-, o que implica redistribuir os recursos entre os que estão sadios e os que estão doentes, e entre os pobres e os ricos.
"Essa redistribuição só é possível com a participação do Estado."
Com base em seus trabalhos, o médico se mostra cético quanto à participação da iniciativa privada na saúde. "Quanto mais dinheiro privado entrar nessa área, menor a possibilidade de o sistema satisfazer o princípio da igualdade."
Segundo ele, "não devemos acreditar que empresas privadas vão resolver os problemas da saúde. Mecanismos de mercado não são soluções para doenças. Os EUA têm hoje o sistema mais caro do mundo e um dos piores serviços dos países desenvolvidos."
A fórmula para um sistema ideal, na sua opinião, é bastante conhecida: descentralização das gestões, menor número de hospitais, equipes multidisciplinares, seguimento no atendimento, cuidados primários de fácil acesso e controle dos atendimentos especializados, evitando desperdícios.
O problema está na implantação desse sistema. Segundo ele, "transformar o sistema de saúde é retirar o dinheiro e o poder de grupos bem instalados". "Mudar essa situação significaria assumir um sério risco político com resultados que só viriam a longo prazo."
Contandriopoulos diz conhecer bem o sistema brasileiro. Ele considera o SUS uma idéia boa, mas com implantação insatisfatória.
"O SUS é uma grande nave com muitos comandantes e o leme avariado", afirmou. "Entre os que querem controlar esse leme estão, entre outros, grupos norte-americanos que vendem saúde."
No Canadá -segundo o especialista-, o médico é um empresário privado financiado pelo Estado. Todo cidadão tem um cartão magnético. Cada consulta ou procedimento é pago pelo Estado diretamente ao médico. O salário de um clínico geral gira em torno de US$ 8.000 por mês. Um especialista recebe cerca de R$ 10 mil.
(AB)

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