São Paulo, sexta-feira, 15 de agosto de 1997
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Um leilão de incentivos

CELSO PINTO

Paulo Villares, presidente do grupo Villares, acha que está na hora de ressuscitar a discussão de dois temas que viraram anátema na última década: proteção e política industrial.
Hoje nem mesmo as entidades empresariais se animam a falar sobre política industrial, muito menos sobre proteção. No fundo, porque pedir política industrial quase sempre equivaleu, no passado, a pedir subsídios, favores e privilégios. Villares, cujo grupo passou por uma profunda reestruturação, está disposto a correr o risco.
Ele acha que o problema, no passado, foi excesso de proteção combinado com escassez de competição. Não deve nem precisa ser assim. O que ele defende é uma política de certa proteção, por tempo definido e com competição, ligada a metas e a desempenho. Parecido com o que fizeram alguns dos tigres asiáticos, como a Coréia.
Uma antiga sugestão de Villares é fazer uma espécie de "leilão de incentivos". Dentro de um certo número de setores que, do ponto de vista de uma estratégia industrial, faria sentido estimular, aqueles que pedissem menos proteção, por menos tempo e se comprometessem com melhores desempenhos teriam prioridade. Quem mais chorasse mais longe estaria do guarda-chuva estatal.
A ausência de uma política industrial transparente, argumenta, não evita privilégios e, sim, os estimula. É o que aconteceu, a seu ver, com o regime automotivo: garantiu proteção e lucros altos para o produto final, em detrimento da cadeia produtiva. Com isso, diz ele, as montadoras estão tendo o privilégio de financiar investimentos com seus próprios lucros e já começaram a pressionar pela prorrogação das vantagens.
O governo "escolher o vencedor", um dos pecados mortais de uma política industrial, acaba acontecendo da pior forma possível: como resposta à força de "lobbies".
Ele não pede mais câmbio e acredita que é possível compensar a sobrevalorização com ganhos de competitividade, se as reformas forem aprofundadas. A Argentina conseguiu, lembra. Só que ainda vai levar tempo, daí por que seria importante uma proteção temporária para setores considerados prioritários. O risco de não adotá-la seria patinar num círculo vicioso de baixo investimento e crescimento, sem equacionar o desequilíbrio externo.
Em tempo: Villares diz que os dois setores em que opera seu grupo, aço e elevadores, não precisam de proteção.
Radiografia oportuna
Desde o final dos anos 80, a economia brasileira passou por um terremoto. Quase meio século de proteção tarifária ruiu; o uso de importados disparou; as empresas passaram por uma profunda reestruturação; houve uma pequena revolução tecnológica, com o fim da Lei da Informática; o gerenciamento administrativo e de pessoal foi virado de cabeça para baixo.
Do ponto de vista das estatísticas, contudo, a matriz de referência continua sendo, em grande medida, o ano de 1980, quando o Fusca reinava, importar era pecado e reengenharia era erro de português. A Fundação Seade, órgão público de pesquisa ligado à Secretaria da Economia e Planejamento do Estado de São Paulo, em boa hora resolveu tentar recuperar o atraso.
Em algumas semanas vai a campo a Pesquisa da Atividade Econômica Paulista (Paep), que vai fazer uma radiografia dos setores industrial, comercial, bancário, de construção e de informática. É quase um censo: só no caso de estabelecimentos pequenos a pesquisa será feita por amostragem.
Ambiciosa, a pesquisa envolve desde dados econômicos básicos das empresas até uma avaliação da inovação tecnológica, gastos com pesquisas, introdução de novas técnicas gerenciais e administrativas, mudanças na utilização da mão-de-obra, informatização, relação com o meio ambiente e terceirização. Em suma, vai mostrar qual a extensão real do processo de reestruturação sobre o qual todos falam, mas do qual só se dispõe de informações e casos pontuais.
A pesquisa será feita em associação com o IBGE, e a coleta de dados vai durar até o final do ano. A Seade espera divulgar os primeiros resultados até o final do primeiro semestre do próximo ano. A principal preocupação, agora, é reduzir ao mínimo o índice de recusa de informações. Os dados têm garantia legal de sigilo e não podem ser usados de forma individual. Tem gente, de todo modo, que tem medo de responder até a censo demográfico.

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