São Paulo, sexta-feira, 15 de agosto de 1997
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Crescimento depende da solução na Previdência

MAILSON DA NÓBREGA

Há sinais inequívocos de exaustão dos efeitos dinâmicos do processo de estabilização, cujos ganhos de produtividade dele decorrentes permitiram um crescimento médio anual de 4,4% nos três anos do Plano Real.
Doravante, o crescimento dependerá da elevação dos investimentos e estes dependerão do aumento da taxa doméstica de poupança. Financiar o investimento adicional com poupança externa agravaria o déficit em conta corrente do balanço de pagamentos.
O aumento da taxa de poupança dificilmente virá das empresas e das famílias. Com a concorrência, aquelas reduziram suas margens de lucro. Com os ganhos de renda dos mais pobres, estas aumentaram, no todo, a propensão a consumir.
Assim, o aumento da taxa de poupança terá que vir do setor público, que hoje despoupa algo como 1% do PIB, mas já poupou 6,7% do PIB em 1977. Esse ponto será crucial para o crescimento sustentado da economia nos próximos anos.
O ajuste não virá do lado da receita. A carga tributária já é de 31% do PIB, a maior entre os países de renda média comparáveis ao Brasil. Dificilmente haverá espaço para ampliá-la.
O ajuste terá que acontecer na despesa. Há fortes evidências de que a redução terá que vir dos gastos previdenciários, incluindo o INSS e os benefícios concedidos aos funcionários públicos.
Infelizmente, a proposta de reforma da Previdência Social, que mantém o regime de repartição, é muito tímida. Seu grande avanço é a extinção da aposentadoria por tempo de serviço, vigente apenas em sete países: Brasil, Benin, Egito, Equador, Irã, Iraque e Kuait.
Estimativas otimistas do Ipea indicam que, considerando apenas o INSS, o déficit é crescente e, se nada for feito, alcançará 2,5% do PIB em 2020 e 4,2% em 2030. A situação será pior no setor público, onde estão concentrados os privilégios.
Ao longo do tempo, grupos se aproveitaram do paternalismo e da irresponsabilidade da classe política para extrair vantagens de uma sociedade indefesa. É uma situação revoltante, mas quase impossível de ser revertida, Quase todos os escândalos estão garantidos pela Constituição.
Legislação defeituosa e interpretação do que sejam vantagens pessoais garantem a coronéis da polícia de São Paulo aposentadoria de R$ 30 mil, aos procuradores do Estado, entre R$ 10 mil e 20 mil, a um marajá de Alagoas, R$ 37 mil, e a outro no Ceará, R$ 43 mil.
Políticos do Rio de Janeiro acabam de ganhar na Justiça aposentadorias mensais vitalícias de R$ 11 mil por terem trabalhado sete meses no extinto Tribunal de Contas dos Municípios.
O Brasil é o único país que paga a um funcionário aposentado mais do que a um na ativa. Nos países ricos, o benefício gira em torno de 50% a 60% dos vencimentos na atividade, podendo chegar a 80% na Itália.
Nenhum país rico paga aposentadorias milionárias a funcionários públicos como o Brasil. Os tetos são de US$ 1.248 nos EUA, US$ 3.500 na Alemanha, US$ 4.000 na França, US$ 2.300 na Espanha e US$ 3.100 na Argentina.
O INSS gastou, em 1996, R$ 42,6 bilhões em benefícios para 16,6 milhões de aposentados e pensionistas. No setor público federal, o gasto foi de R$ 17,1 bilhões com 873 mil inativos e pensionistas. Ou seja, 4,5% dos beneficiários consomem 19,2% dos gastos totais.
Os aposentados do INSS ganham, em média, 1,7 salário mínimo por mês. No setor público federal, as médias alcançam 13,3 salários mínimos no Executivo, 30,4 no Legislativo e 22,7 no Judiciário. O recolhimento dos funcionários é de apenas 15% da despesa previdenciária.
Funcionários públicos podem aposentar-se aos 37 anos de idade. A idade média de aposentadoria com proventos integrais é de 56,6 anos. Um quinto se aposenta com menos de 50 anos.
Os gastos previdenciários no Brasil chegaram a R$ 88,7 bilhões em 1996, ou cerca de 12% do PIB e 38,4% de toda a carga tributária. E a conta não vai parar de crescer, principalmente no setor público.
A reforma da Previdência está muito longe de resolver o problema. O país está sob ameaça de baixo crescimento ou de volta à inflação caso não encontremos a saída.
Necessitamos, pois, de uma reforma radical logo no início do próximo governo, baseada no regime de capitalização e sem qualquer privilégio, a não ser para os desvalidos.
Restará o problema do estoque de direitos adquiridos. Tentativas de podá-los têm-se revelado inglórias. Baseados na lei, a maioria termina sendo confirmada pela Justiça. O pouco compreendido fundo de ativos proposto por Raul Velloso pode ser a solução.

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