São Paulo, domingo, 17 de agosto de 1997
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Paz tributária

OSIRIS LOPES FILHO

O Senado iniciou discussão acerca da proposta de emenda constitucional (PEC) nº 19, de 1996, apresentada pelo senador Waldeck Ornelas, que modifica a sistemática de concessão dos chamados "benefícios fiscais", no âmbito do ICMS.
A decisão sobre tal matéria, hoje deferida ao Conselho de Política Fazendária (Confaz), passará a ser atribuída ao Senado, que fixará, considerando os objetivos de "garantir o desenvolvimento nacional" e "erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais" (art. 3º, II e III da Constituição federal), os parâmetros dentro dos quais as unidades da Federação poderão conceder a variada gama de favores do ICMS.
A concepção da PEC 19/96 é engenhosa. Concede ao Senado, casa do legislativo caracterizada pela igualdade da representação estadual e garantidora do equilíbrio da Federação, a competência para fixar limites aos favores fiscais do ICMS, atendidos dois dos objetivos fundamentais da república brasileira, expressos no art. 3º da CF, facultando a cada unidade da Federação a decisão sobre a intensidade e a natureza do favor fiscal.
É um grande avanço. Na desigualdade que caracteriza os nossos entes federados, é óbvio que alguns podem mais do que os outros.
A emenda postula o fortalecimento do papel desempenhado pelo Senado na estrutura estatal brasileira. E reduz a função desempenhada pelo Confaz, órgão gerado na ditadura militar que tem castrado a representatividade das assembléias estaduais.
Há outra virtude no projeto. Vai disciplinar a competição em que cada Estado procura fazer, em escalada, ofertas generosas, objetivando captar investimentos para o seu território.
Esse ambiente de oferecimento e competição já se chamou de leilão tributário. Agora, enfatizando-se sua índole belicosa e predatória, denominou-se guerra fiscal.
O clima de sedução e atração que se instaura, em que a oferta de favores ultrapassa o nível de generosidade para alcançar o da indecência, está a tipificar um strip-tease. Despudoradamente despem-se as vestes republicanas da prudência e do zelo com as finanças públicas para se oferecer, impudicamente, o irrenunciável e indisponível, comprometendo o futuro do Estado.
É hora de o Congresso aprovar uma alteração na Constituição que o dignifique como a Casa do povo e não da tolerância ao Executivo.

Osiris de Azevedo Lopes Filho, 57, advogado, é professor de Direito Tributário da Universidade de Brasília e ex-secretário da Receita Federal.

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