São Paulo, domingo, 17 de agosto de 1997
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ORIGO VITAE

DE UMA ESPÉCIE DOMÉSTICA

-domesticável-
pompeando como um pendão
grandeaberto seu negro tosão
sua felpa veludínea
recortada em triângulo
interstícios pelos (entre-
mentes)
recorta-se a brecha de onde a vida
desabrocha: grumo pérola
ampola fetal ov-
ante infante
que emerge da amniótica
piscina placentária:
então a vida grita
espasma
desumbilicada de seu fio
nutriente
essente e só
no oco do nascedouro e
parida en-
derençando-se ao funil
torvo da morte apenas
(por quanto tempo?)
delongada mas agora

é vida
buscando o seu viveiro
ao arenoso ritmo
fluente e
neutro da ampulheta
que escoa

e depois de gerar
ei-la a vaginada aranha
canibal
devolta ao seu mister de
vênus
ao seu monte de pelúcida
alfombra e clitorídea ninfa
e ao seu ofício
carní -
vorante

crua e nua
brasonada
boosco deleitoso
orto meio-aberto meio-ocluso
entre lisas coxas branco-bi-
furcadas -ora
escumoso
bucentauro de núpcias
ora
carenada caverna ou
sorvedouro válvulo
que-
dionéia de cílios
licorosos
drósera orvalhada
e purpurante
ros solis-
devora carne humana
e lancinada
goza

HAROLDO DE CAMPOS

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