São Paulo, domingo, 17 de agosto de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Como se vestem os milionários

GILBERTO DIMENSTEIN

Empresários americanos milionários estão ditando a moda para gente bem-sucedida se vestir, esmagando os estilistas da Itália, França ou Japão.
Num ataque à solenidade e às griffes, eles fogem dos ternos, gravatas, sapatos de couro. Metem-se numa calça jeans e camisa esporte. Custo do conjunto: R$ 100. O estilo se espalha pelas empresas, do mais alto executivo até o porteiro, quase todos se vestindo iguais.
Como são versados em negócios, sabem que, em essência, quase não existe diferença nos jeans, tenham um nome de estilista italiano ou feito numa fábrica clandestina por chineses em Nova York. Usam a primeira Lee ou Levi's que aparecer.
O ícone desse estilo universitário de quem não gasta mais de 30 segundos na frente do espelho é Bill Gates, o homem mais rico do mundo, cuja vaidade é ditar a moda não do que as pessoas vestem, mas de como pensam.
Por trás dessa tendência há um dos mais instigantes fenômenos nos negócios americanos -os empresários estão cada vez mais jovens, trazendo ainda o armário (e a informalidade) dos tempos da escola.
*
Estatísticas do governo americano indicam que se expande uma geração de empresários quase adolescentes.
Muitos abandonam a escola (caso de Bill Gates) ou vão levando na flauta apenas para ganhar o diploma.
Inteligentes, talentosos e com disposição, sabem estudar sozinhos; apostam que o aprendizado prático supera as horas trancados na biblioteca. Para um razoável conhecedor de Internet, o mundo é, aliás, uma biblioteca, repleta de professores.
No mais, uma das mais prósperas atividades universitárias são os cursos para adultos que buscam novas habilidades ou se manter atualizados.
Uma pesquisa revelou que 10% de todos os americanos entre 25 a 30 anos estão envolvidos na criação de uma empresa.
*
Esse comportamento é favorecido por uma tendência deste final do século, marcado pela era da informação.
Para quem tem educação tecnológica, nunca foi tão fácil abrir seu próprio negócio. Exige mais inteligência do que investimentos criar um software, por exemplo.
Com os novos meios de comunicação, qualquer pessoa pode fazer do seu apartamento um escritório conectado com o resto do mundo ao custo de uma ligação local.
*
O projeto da imensa maioria dos americanos não é mais ser empregado -55%, segundo as pesquisas, querem ter seu próprio negócio; 19% se contentam em ser free-lancers (apenas cumprir tarefas determinadas para diferentes empresas).
Veja os números: ano passado, foram abertos 3,5 milhões de novos negócios por 5 milhões de pessoas. É menos do que duas pessoas por negócio.
Por isso, gente com dinheiro no bolso rasteja pelas universidades oferecendo financiamento para projetos de estudantes talentosos. Pedem em troca participação acionária.
*
Aí está uma das razões do desespero do setor de recursos humanos na empresas de alta tecnologia para recrutar funcionários qualificados; nesse setor há uma carência de 200 mil empregados.
Aqueles que, no passado, seriam seus candidatos naturais a uma vaga, hoje preferem abrir seu próprio negócios e vender serviço.
Sinal do desespero podia ser visto em várias praias neste verão americano: empresas montaram barracas na orla, oferecendo as mais inacreditáveis vantagens -passagens ao Havaí, por exemplo- para quem aceitar o emprego.
*
PS - Na coluna passada, contei do meu prazer em garimpar nas lojas de discos aqui em Nova York. Por e-mail, recebi de várias pessoas a seguinte pergunta: se eu tivesse de destacas apenas uma -não mais do que uma- descoberta, qual seria.
Minhas resposta: é um CD do clarinetista Tony Scott, um dos príncipes do jazz, acompanhado de mestres japoneses. Gravado pela primeira vez em 1964 (atualizado agora pela Verve), ele incorpora ao jazz o ritmo de melodias zen para meditação.
O título é "Music for Zen Meditation". Provoca uma sensação semelhante à de quem tomou quatro copos de vinho branco bem gelado, está deitando na rede, debaixo da sombra, frente para o mar, sem ninguém por perto -e na certeza de que a segunda-feira não está perto.

Fax: (001-212) 873-1045
E-mail gdimen@aol.com

Texto Anterior: Quem são os curdos
Próximo Texto: Revistas masculinas batem as femininas
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.