São Paulo, domingo, 17 de agosto de 1997
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Índia e Argentina

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Dois exemplos, um antigo, outro da semana que passou. A Índia comemorou os 50 anos de sua independência. Para conseguir se libertar da globalização da época, os indianos ficaram privados de sal -como os americanos renunciaram ao chá, para provar aos ingleses que poderiam viver sem os bens de consumo que vinham da metrópole.
A represália, no caso da Índia, foi dura. Nem tecidos vinham da Inglaterra; os indianos tiveram de improvisar teares e fibras primitivas para cobrir seus corpos. A luta pela independência, liderada e moderada pelo Mahatma Gandhi, é considerada pacífica, mas custou sacrifício de todo o povo. Seria neoliberal e moderno se os indianos, na base do custo menor e da qualidade maior, ficassem até hoje colonizados pela Inglaterra ou pela potência que a substituísse.
A Argentina de hoje vive o seu melhor momento econômico. Privatizou empresas, enxugou despesas, exporta mais de 200 mil carros para o Brasil, é um dos melhores exemplos da eficiência do mercado. Na semana que passou, houve tumultos em Mar del Plata e em outras cidades. A taxa de desempregados chegou a 17%. A concentração de renda, que é bem menos perversa do que a do Brasil, está criando bolsões de miséria num país sabidamente rico de recursos.
Poderia citar outros casos. Tirante os quase 20 países que dispõem de uma infra-estrutura anterior ao fim da Guerra Fria, a situação é quase a mesma. Uns mais, outros menos, todos estão no fio da navalha de truques que vão da paridade com o dólar à eliminação gradual dos gastos sociais.
O neoliberalismo descobriu a pólvora. Gastando menos ou gastando nada com saúde, educação, transportes e segurança, sobrará mais dinheiro para a grande empresa que é o Estado, de uma vez por todas liberado da jurássica necessidade de gerir os recursos do país em benefício da sociedade.

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