São Paulo, terça-feira, 26 de agosto de 1997
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Eu ganho, eles que se danem

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - Ainda bem que apareceu por aqui Jeremy Rifkin e que esta Folha o entrevistou. Como se trata de um norte-americano e, ainda por cima, presidente de uma fundação com o pomposo nome de Fundação das Tendências Econômicas, suspeito que será ouvido com a deferência a que os tupiniquins não temos direito.
O que Rifkin disse, na entrevista ontem publicada, é óbvio: "O capitalismo está fazendo o que ele faz de melhor, que é criar novas oportunidades. Mas o que ele não sabe fazer é distribuir os frutos colhidos pelo seu sucesso".
Quando algum dos colunistas desta Folha ou algum líder de esquerda diz a mesma coisa, chovem acusações. É jurássico, é saudosista do comunismo, o diabo a quatro, gritam os neoliberais de sempre e os recém-convertidos.
Rifkin pode até ter razão sobre o capitalismo, se estiver falando apenas em tese, em princípios gerais. Se, no entanto, circunscrever a sua análise ao capitalismo brasileiro, exagera.
Afinal, capitalismo pressupõe regras e controles. Não é o "laissez-faire" absoluto, a lei da selva, o vale-tudo. Pelo menos o capitalismo dito avançado tenta ser assim.
No Brasil, é ao contrário. Basta acompanhar o caso da Encol, para ficar apenas no mais recente exemplo. Ou o dos bancos Nacional, Bamerindus e Econômico. Ou o de planos de saúde particulares que estão com a corda no pescoço.
O que há de comum em todos eles é que as empresas faliram (ou quase), mas seus proprietários estão podres de ricos. Visto pelo ângulo de Rifkin, o capitalismo brasileiro cria, sim, "novas oportunidades", mas apenas para os donos do capital. Os riscos são só da clientela.
O capitalismo brasileiro desmente a segunda parte da frase de Rifkin. Sabe, sim, "distribuir os frutos colhidos pelo seu sucesso", mas conjuga o verbo ganhar desta maneira: "Eu (o dono do negócio) ganho, eles (os clientes) perdem". Assim, até eu.

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