São Paulo, domingo, 31 de agosto de 1997
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Sonho e pesadelo

OSIRIS LOPES FILHO

Um leitor amigo, que acompanha os debates do Senado, envia-me interessante discurso do senador Roberto Freire, em sessão de 12 de agosto.
O assunto é a transformação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) em tributo não mais temporário, mas permanente. O senador quer perpetuá-lo. Para tanto, apresentou emenda ao projeto, que tramita no Senado, da reforma previdenciária.
A proposta do senador é mais ousada do que a do governo FHC, que postula modesta e matreiramente sua prorrogação por mais onze meses, por lei, dispensado o "quorum" qualificado necessário à aprovação da emenda constitucional.
O fato merece análise, pois se trata de líder de um pequeno partido, o PPS, que na sua versão anterior teve longa e sacrificada história de defesa da classe trabalhadora. Dando seguimento a essa vocação, pretende o senador manter definitivamente a incidência, pois, como afirma, "a CPMF não penaliza assalariado ou classe média". E continua: "Ela, de fato, só atinge quem faz da especulação financeira sua fonte de renda e que, com esse imposto, fica impedido de sonegar". Acrescenta que "é um imposto perfeito, porque insonegável".
É uma oportunidade rara a que está surgindo. Debater-se uma incidência tributária ainda precária, posto que provisória, sem que se lhe aplique a tramitação de marcha acelerada típica desse governo.
A CPMF alcança os fluxos financeiros existentes na economia. Abrange, portanto, as movimentações financeiras da produção até o consumo dos bens e serviços pelo adquirente final. Sobrecarrega os custos gerais da economia.
Dir-se-á que sua alíquota de 0,20% é ínfima. É verdade. É uma gota d'água. Uma gota d'água, num temporal, pois se soma ao IPI, ICMS, Cofins, PIS, ISS, Imposto de importação, que tem tornado indecente o custo tributário da produção brasileira, apenando o consumo popular e transformando o contrabando em atividade rentável.
A CPMF pega também a poupança e depósitos da população. A extorsão legalizada é completa. Abrange produção, circulação, consumo, investimento e poupança.
A sua impossibilidade de sonegação é uma questão de fé. Depois da quebradeira e maracutaias do Nacional, Econômico e Bamerindus, a insonegabilidade da CPMF é apanágio dos que têm fé. Muita fé.

Osiris de Azevedo Lopes Filho, 57, advogado, é professor de Direito Tributário da Universidade de Brasília e ex-secretário da Receita Federal.

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