São Paulo, domingo, 31 de agosto de 1997
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Globalização não tem padrões tecnológicos

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Quase sinônimos, tecnologia e globalização marcam os destinos da economia contemporânea.
O curioso, entretanto, é que a guerra de padrões tecnológicos ainda está acontecendo. Se o horizonte da globalização é a sociedade de massas, a massificação de algumas das mais importantes tecnologias ainda é uma miragem.
Claro que a imposição de um modelo faz toda a diferença. Bill Gates que o diga. Mas, apesar da sua fortuna, nada é mais discutível hoje que a idéia de um mundo sujeito ao império da Microsoft.
Aliás, o próprio Gates anunciou há poucos dias um investimento de US$ 150 milhões na antiga rival Apple. Ele está sendo investigado por tentativa de monopolização em nichos como vídeo para Internet. Ou seja, Gates está feliz, mas não está tranquilo.
A IBM, a Sun e a Netscape partiram para a coordenação de seus projetos. A idéia é criar um sistema universal, compatível com qualquer sistema e não apenas com o Windows, da Microsoft.
Falar em padrões é pouco. Pois o que está em jogo não é apenas usar o software da Microsoft ou escolher entre PCs e Macs.
Ainda não está claro se a economia da informação vai girar, nos próximos anos, em torno de computadores e televisões ou se a Internet, evoluindo, vai criar uma indústria completamente diferente, que transforme em sucata, da noite para o dia, toda a Microsoft.
As violentas oscilações nos papéis de alta tecnologia em Wall Street refletem um setor cujos contornos ainda estão em questão.
Para os adeptos do "network computer" (computador em rede), é ridículo comprar uma máquina cheia de programas pesados e caros. A rede substitui a máquina, e esta fica reduzida a um objeto simples, apenas para acesso à rede.
A conclusão é simples: Microsoft e Apple podem estar formando fileiras do lado errado, apostando no fortalecimento de um padrão para uma tecnologia que talvez nem exista em alguns anos.
Efeito Betamax
O fenômeno da massificação global sem estabilização de padrões tecnológicos, com intensa competição, não se limita ao mundo dos computadores. Os ciclos se repetem na indústria de vídeo.
A Sony, que lançou o sistema de vídeo Betamax há cerca de uma década apenas para morrer na praia diante do sucesso imbatível do formato VHS, volta à carga.
Anunciou, há poucos dias, que rompia uma aliança de desenvolvimento com outras empresas de um padrão para o videodisco digital (DVD). Os produtos para vídeo digital são atualmente uma sopa de letrinhas (as siglas que definem cada formato), mas deverão suceder a fita VHS em pouco tempo.
Ao romper o acordo, que já não contava com o apoio da NEC, a Sony lançou uma sombra de incerteza sobre todo um setor emergente. Ninguém sabe que formatos ou máquinas vão, afinal, vingar. Mas o butim é promissor. Só no Japão, o mercado é avaliado em cerca US$ 25 bilhões até o ano 2000.
Exemplos semelhantes podem ser encontrados em outros nichos: televisão de alta definição, telefonia celular, trens de alta velocidade. Padrões, culturas, protocolos, interesses nacionais e ambições monopolistas são às vezes mais importantes que o horizonte, ainda incerto, de uma estrutura homogênea global.

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